segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Pablo Neruda y Federico García Lorca, dos bromistas geniales. Sus comedias y sus tragedias.




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Pablo Neruda y Federico García Lorca, dos bromistas geniales. 

Sus comedias y sus tragedias.



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E vai aqui mais um pouco de lenha para a fogueira das nossas eternas lembranças e reflexões sobre Federico García Lorca e Pablo Neruda.

O livro "Confieso que he vivido" - ou Confesso que Vivi, em português- conta as memórias nas quais o poeta chileno Pablo Neruda trabalhou até pouco antes de morrer, em 1973. A obra foi publicada sem alguns dos escritos do prêmio Nobel chileno, alguns com textos inéditos, entre eles um sobre o poeta espanhol Federico García Lorca, textos que foram recuperados há um ano numa nova edição, ampliada.
A editora espanhola Seix Barral publicou a edição ampliada de Confesso que Vivi, que agora contém o texto “O último amor de Federico”, e ainda um álbum de fotografias com a reprodução em fac-simil de vários manuscritos do amado poeta andaluz, assassinado pelos franquistas em 1936.
As memórias do escritor chileno foram publicadas como parte da celebração dos 70 anos de Pablo Neruda, em 1974, mas sua morte, ainda suspeita e precipitada pelo golpe militar no Chile, ocorreu em dia 23 de setembro de 1973, motivo pelo qual o livro foi lançado como uma obra póstuma.
Nos arquivos da Fundação Pablo Neruda foram achados vários textos relacionados com as referidas memórias: o primeiro deles, de junho de 1973, continha manuscritos de Neruda sobre alguns dos temas que deveria incluir em “Confesso que vivi”, e duas pastas com escritos autobiográficos ainda inéditos.
Entre eles, um tratava de García Lorca, e ainda Pablo Neruda agregava uma explicação de porquê ele achava que o texto não deveria ser publicado naquele momento, em 1973.
-“Será que o público está suficientemente livre de preconceitos para aceitar a homossexualidade de Federico, sem menosprezar seu prestígio?”- se perguntava Neruda.
No texto que veio a público na nova edição, Neruda lembra que, nas tertúlias das quais participaram, Federico García Lorca sempre estava acompanhado de um jovem.
Tratava-se de Rafael Rapín, ou Rafael Rodríguez Rapún, morto durante a Guerra Civil espanhola, pouco depois da morte do poeta: “pouco restou do rapaz. Seus ossos e seu sangue se espalharam em fragmentos minúsculos, tonaram-se manchas quase invisíveis, sobre a terra espanhola, que tragava a cada dia milhares de outros mortos anônimos.”
Para Pablo Neruda, existia “uma forma obscurantista de tratar da homossexualidade de Federico García Lorca” e que era “a moda espanhola e latino-americana: esconder sequer essa inclinação pessoal de Federico. Há muito, nessa atitude, de respeito pelo poeta assassinado. Mas existe também o tabu sexual, a herança eclesiástica do império e da colonização espanhola, a hipocrisia do século XIX”.
Considerou que era una cortina de fumaça o fato de atribuírem à “singularidade erótica” de Lorca a causa de sua morte, que para Neruda foi um simples e “repugnante” assassinato político.
Em Confesso que Vivi, Neruda narra os principais momentos da sua vida e as circunstâncias da criação dos seus poemas e dos livros mais conhecidos, além de relembrar das figuras de alguns amigos como Alberti, Miguel Hernández, Éluard, Aragão e sua relação com personagens destacados da política contemporânea. 
É interessante ler -ao mesmo tempo, se possível- as memórias de Zélia Gattai, contando o mesmo período, nas viagens com o marido, Jorge Amado.

JV. Agosto de 2016

P.S: Sempre senti um amor estranho pelos dois: Neruda machão e mulherengo, que adorava seu amigo-niño, el niño-poeta, assassinado pelos fascistas "por poeta, rojo y maricón". Era Federico García Lorca, seu amigo de travessuras, com o que tirava sarro dos conservadores, dos "decimonónicos", e suas obras (Platero y yo, por exemplo). Neruda e Lorca faziam bullyng com o coitado do Juan Ramón Jimenez, mandando bilhetinhos anônimos, chamando-o de algo assim como "carcamano".
A amizade de Pablo e Federico era genial, e produziu centenas de anedotas engraçadas e inteligentes, como a do Toreo al Alimón, que já contei neste blog algumas vezes. (https://javiervillanuevaliteratura.blogspot.com/2013/03/toreo-al-alimon-pablo-neruda-y-federico.html?fbclid=IwAR07tRW9PX9ssLN1eoRUDVdavRB1JxRC-hSxIhU4tVkAxst7fSDGoU9Eef4).

Também outras figuras das letras, como Oscar Wilde, Oscar Wilde, preso em razão de sua sexualidade. Ou Roger Casement, que denunciou os crimes do rei da Bélgica no Congo e a exploração desumana dos trabalhadores da borracha no Peru -paralelo ao período no Brasil-. Foi fuzilado por causa das confissões no seu diário em que se define como gay. Com O Coração das Trevas, Joseph Conrad tinha mobilizado pouco antes as  grandes personalidades da virada do século XX para o que ocorria no Estado Livre do Congo, a empresa de exploração do rei belga, Leopoldo II. Mas não o teria conseguido sem as denúncias prévias de Roger Casement. Mas Casement apoiou a causa irlandesa contra a Grã Bretanha e foi preso por traição. Mas de fato, porém, foi morto por causa de trechos do seu diário com relatos de sua vida sexual que foram usados para detratá-lo e humilhá-lo publicamente.
Federico García Lorca e Casement, assim como O.Wild, foram punidos por serem gays. Os dois primeiros a bala, o terceiro com a cadeia. Os três denunciavam, cada um a seu modo, as sociedades em que viveram.

domingo, 18 de agosto de 2019

Qual é a origem das línguas ibéricas?

Certas PalavrasPublicação de Marco Neves sobre línguas e outras viagens 

Qual é a origem das línguas ibéricas?


Qual é a origem das línguas ibéricas?

É verdade que a sorte que tiveram foi muito diferente — mas, do mirandês ao castelhano, as línguas que hoje encontramos na nossa península fizeram quase todas, na sua origem, uma viagem de norte para sul (o «quase» está ali por culpa dos bascos). Aqui fica uma brevíssima viagem pela origem das línguas ibéricas, retirada do livro O Galego e o Português São a Mesma Língua? (Através, 2019).

https://www.certaspalavras.net/qual-e-a-origem-das-linguas-ibericas/?utm_source=BLOGUE+CERTAS+PALAVRAS&utm_campaign=425fe5551d-EMAIL_CAMPAIGN_3_7_2018_COPY_218&utm_medium=email&utm_term=0_db0899fdaf-425fe5551d-151735405

Que línguas se falavam antes da chegada do latim?
Os linguistas, desde o século XIX, estudam a história antiga das línguas, antes mesmo da escrita, através do método comparativo. Como funciona este método? Sabendo que as línguas tendem a divergir, presume-se que divergem de um ponto comum, no passado. Assim, comparando-as, conseguimos encontrar famílias de línguas com a mesma origem mais ou menos remota.
Todos sabemos, por exemplo, que as línguas românicas têm origem no latim. Há, aliás, alguns vestígios escritos que permitem chegar a essa conclusão — e há, acima de tudo, o próprio latim escrito com o qual podemos comparar as línguas românicas actuais, encontrando facilmente linhas de continuidade e divergência que apresentam muita regularidade.
No entanto, se não conhecêssemos o latim, conseguiríamos mesmo assim encontrar semelhanças suficientes entre as línguas latinas para reconstruir com alguma segurança muitas das características dessa língua-mãe.[1]
  • Catalão: amor
  • Espanhol: amor
  • Francês: amour
  • Italiano: amore
  • Português: amor
  • Romeno: amor
Se não soubéssemos latim, poderíamos concluir que estas proximidades são fruto da coincidência? É difícil, com tantas línguas a acertar na palavra. Podia ser uma questão de empréstimo? Sim: o islandês, por exemplo, também tem a palavra «amor». Aliás, se olhássemos para a palavra «rosa», pareceria que as línguas germânicas e as latinas têm a mesma origem:
  • Francês: rose
  • Alemão: Rose
  • Holandês: roos
  • Dinamarquês: ros
  • Inglês: rose
  • Espanhol: rosa
  • Português: rosa
É por esta razão que o método comparativo não funciona com uma palavra isolada. Funciona com muitas palavras e traços gramaticais, rigorosamente comparados.
O certo é que as línguas latinas partilham muitas palavras e muitas características gramaticais que não partilham com as línguas vizinhas. Para chegar a esta conclusão é preciso estudar com afinco as palavras, as características gramaticais — e há muitas hesitações, caminhos errados, descobertas. Mas consegue-se. E consegue-se mais ainda: sabendo as alterações típicas de cada língua mais recente, podemos reconstruir a língua original.
No caso do latim, não temos de reconstruir a língua original. No entanto, este método (o método comparativo) permitiu-nos descobrir que o latim do qual descendem as línguas românicas não é exactamente o mesmo latim dos textos escritos clássicos. A língua da oralidade nunca é igual à da escrita. A língua formal nunca é igual à língua da rua. E, na verdade, as nossas línguas actuais descendem do latim da rua e não do latim dos livros.
Pois bem: se olharmos para o que veio antes do latim, não temos registos escritos. Mas o método comparativo deu os seus interessantíssimos frutos: descobriu-se que quase todas as línguas da Europa descendem duma língua comum. Essa língua deu também origem às línguas iranianas (o persa, por exemplo) e às línguas do Norte da Índia. Assim, o nome que lhe foi dado é este: proto-indo-europeu. As investigações linguísticas permitiram também descobrir onde vivia o povo que falava essa língua — com toda a probabilidade, no território que é hoje a actual Ucrânia.[2]
Essa tribo indo-europeia espalhou-se e invadiu os territórios vizinhos. O certo é que quase toda a Europa fala hoje línguas que descendem da língua desse povo. As excepções são curiosas: o turco, falado no pequeno território turco na Europa; o húngaro, finlandês e estónio, com origem em povos que chegaram à Europa já depois da expansão indo-europeia, vindos das profundezas da Sibéria; o maltês, aparentado com o árabe; e o basco, num recanto da Península Ibérica.
Bem, mas pensemos nesses indo-europeus, pais das línguas da Europa quase toda. Chegaram à nossa península ali entre os séculos VIII e VI a.C. Encontraram povos autóctones que podemos chamar de iberos, embora saibamos muito pouco deles. Estes invasores indo-europeus são muitas vezes referidos como celtas — por esta época já o povo indo-europeu estava dividido em várias famílias linguísticas e a primeira invasão foi desses celtas.
Foram esses povos que os romanos e os povos germânicos que se lhes seguiram vieram encontrar — note-se que, na península, o latim foi introduzido não apenas pelos romanos, mas pelos germanos que vieram governar a península e que já tinham adoptado o latim.

O que aconteceu depois da chegada do latim?

O latim apagou as línguas anteriores, tanto as pré-indo-europeias, como as indo-europeias — excepto o basco, que sobreviveu a isto tudo.[3] Diga-se que as línguas anteriores influenciaram a maneira como a população aprendeu latim — e terão tido influência no particular percurso do latim até às várias línguas ibéricas. Essa influência é particularmente importante quando uma população adulta aprende outra língua. Um adulto já não consegue aprender uma língua como se fosse um falante nativo: a máquina de reconstruir a gramática começa a desligar-se na adolescência. Ora, se uma população adulta aprende uma língua, aprende-a de forma simplificada e com características fonéticas da sua língua materna. Ora, se muitos habitantes da nossa península aprenderam latim já na idade adulta, aprenderam-no como estrangeiros — e é desse latim mal aprendido que nasceram as nossas línguas…
Ora porque tinha sido trazido por soldados, ora porque tinha sido trazido por germanos que o tinham aprendido como adultos, ora porque foi aprendido na idade adulta pelas populações da península, o certo é que, pelas ruas da Península, o latim da população era diferente do latim de Roma — e do latim da escrita. Claro que a norma terá tido o seu efeito: muitos aprenderam o latim clássico e talvez alguns falassem quase como em Roma. Mas é dessas correntes de profundas mudanças que nasceram as nossas línguas de hoje em dia.
Nesta história abreviada, chegamos ao século VIII. Chegam os muçulmanos. A península divide-se em duas zonas. A sul, os muçulmanos governam e a população continua a falar o tal latim da rua, mas agora com muita influência da nova língua de prestígio: o árabe.
A norte, cria-se uma série de reinos, principados e condados cujo principal propósito era reconquistar território aos muçulmanos, para sul. A língua era ainda o latim, mas o latim que se afastava cada vez mais do latim clássico.
Nestas guerras entre norte e sul e nesta expansão vemos a história das línguas e dos povos actuais — entre elas a história da origem da língua portuguesa.

Qual era a situação por volta do ano 1000?

É um bom ano para pararmos um pouco nesta nossa viagem: redondo e fácil de encontrar nas cronologias.
No sul da Península, temos um grande território sob domínio muçulmano. Lá em cima, uma faixa cristã. Tirando a elite de língua árabe no Sul, quase toda a população da península fala qualquer coisa que descende do latim. Os cristãos sob domínio muçulmano falam um latim tardio a que hoje chamamos moçárabe. É um romance com muitas palavras árabes (compreensivelmente). Há-de ter alguma importância na história que estou a contar.
Ali num canto, onde os Pirenéus encontram o Atlântico, um velho povo resiste com a sua língua pré-latina. Aliás, pré-indo-europeia. Falo dos bascos. Nesse canto, o latim não entrou. Ou melhor, entrou, mas não fez desaparecer a língua que lá havia antes.
Deixemos, para já, o basco no seu recanto (havemos de lá voltar). Toda a faixa norte está ocupada pelos reinos, condados e demais entidades mais ou menos duradouras que se ocupam a ir conquistando a península de cima para baixo.
As fronteiras entre os reinos são muito, mas mesmo muito maleáveis. Surgem e desaparecem reinos entre a manhã e a tarde do mesmo dia. Talvez exagere: mas entre o nascimento e a morte de um rei, entram e saem territórios com grande à-vontade. Imagino que muitas pessoas tenham vivido a sua vida sem saber muito bem a que reino pertenciam.
Conhecemos alguns nomes: Astúrias, onde se deu a famosa – e provavelmente mítica – batalha de Covadonga. Aragão. Leão. Castela. Catalunha. Galiza. Portugal…
A lista acima está desordenada – não importa. O que importa, agora, é pensar na questão das línguas.
Pois, as línguas ibéricas, muito por culpa do processo de conquista, foram criadas nessa faixa norte e, depois, expandiram-se para sul, comendo o território ao moçárabe (que, no entanto, não desapareceu por completo — influenciou essas mesmas línguas no processo de expansão para sul).

Uma história em cinco faixas

Para percebermos o que se passou, dividamos a tal faixa norte em cinco parcelas, mais ou menos iguais, que correspondem a cinco línguas.
Isto é uma simplificação. Nas fronteiras entre as parcelas, havia muita mistura – aliás, estamos perante um continuum dialectal, ou seja, um território onde não há fronteiras muito definidas entre línguas (excepto, neste caso, as fronteiras do basco).
Esta divisão em cinco parcelas ajuda-nos muito a perceber a origem – e a situação actual – das línguas ibéricas. A sua expansão foi na vertical: de norte para sul – embora a língua central tenha começado a engordar, atropelando as vizinhas.
Comecemos a história pelo V, encostado ao Mediterrâneo, para terminar no I, encostado ao Atlântico.
Na faixa V, desenvolveu-se a língua que hoje conhecemos, em geral, como catalão. O catalão está muito próximo do occitano, uma língua falada no sul de França[4]. Está também próximo do francês. Isto, no que toca ao léxico. Note-se, por exemplo, palavras como «parlar», «manjar»… Ou «por», muito mais próximo do «peur» francês do que do «miedo» castelhano.
O catalão foi a língua principal da corte dos soberanos da Coroa de Aragão. Barcelona era a principal cidade, embora a capital fosse dupla: Saragoça e Barcelona. As línguas da corte eram também duas: aragonês e catalão. No entanto, na verdade, o catalão era a língua de mais prestígio, língua de Barcelona, a principal cidade marítima do território, língua por excelência daquela Coroa e da sua expansão pelo Mediterrâneo. Ainda hoje temos vestígios dessa expansão: há uma terra na Sardenha onde o catalão ainda se ouve entre as gerações mais velhas. Note-se que, em Valência, o nome habitual que se dá à língua própria da região é «valenciano» — se o valenciano é uma língua própria ou um nome alternativo para o catalão é discussão que ocupa muitos valencianos. Os linguistas, em geral, consideram o valenciano como um glotónimo(nome de língua) do catalão.
Saltemos (por agora) por cima da faixa IV e avancemos para a faixa do meio, a III. Falamos do castelhano — esta língua acabou por ser a língua de uma importantíssima coroa. Ganhou prestígio. Expandiu-se para sul, a cavalo da coroa castelhana — e pelo mundo a cavalo da expansão marítima. Entretanto, começou também a ser chamada «espanhol». Desta forma, é uma língua com dois glotónimos: «castelhano» e «espanhol». Com estes dois nomes, é língua de muitos países e oficial em toda a Espanha.
Repare-se que o castelhano surgiu encostado ao basco. Ora, isto tem a sua importância. Há características muito castelhanas, que distinguem a língua das sua vizinhas, que talvez tenham vindo do basco. Um dos exemplos por vezes apontados é a pobreza vocálica: tanto o basco como o castelhano têm poucas vogais (apenas cinco), enquanto as línguas vizinhas (o catalão e o português, por exemplo) têm muitas mais. Apetece dizer que o castelhano era o romance ibérico falado por gente habituada a ouvir e a falar basco.
O II e o IV são as duas faixas em que as línguas mais se perderam. Hoje, nenhuma delas é oficial, embora sejam reconhecidas como património cultural pelas Astúrias e por Aragão.  Nestas faixas, a expansão para sul ficou cortada pela expansão do castelhano e do catalão. Hoje em dia, estão em perigo de desaparecer. A língua da faixa II, no entanto, é oficial… em Portugal! Sim, esta língua tem vários nomes e variedades. É o asturiano, mas também o leonês — ou o mirandês! O mirandês faz parte desta segunda faixa.
Chegamos, por fim, à faixa I. O galego — e o português… Tudo indica que a nossa língua começou nesse noroeste da Península, muito antes da criação de Portugal. Ninguém lhe daria nome, mas como estamos na Galécia, podemos falar de galécio — ou galego.
Quando chegamos ao século XII, a língua na rua era o tal galego, designado pelos seus falantes usando a palavra «linguagem» — era a linguagem da fala dos galegos e dos novíssimos portugueses. A língua dos documentos oficiais era, ainda, o latim. Note-se que, antes de se tornar oficial em Portugal, a língua foi usada, com muito proveito, para as produções artísticas da corte de vários reis. O rei castelhano Afonso X escreveu boa poesia na nossa língua!
Quando Afonso Henriques criou o reino de Portugal, a faixa I das línguas ibéricas, a mais ocidental, ficou dividida por uma fronteira política que veio a revelar-se uma das mais resistentes de todo o mundo. O Reino de Portugal expandiu-se de norte para sul e levou com ele a língua, que sofreu influências do moçárabe. Algumas gerações depois, a corte de D. Dinis transformou a tal linguagem trazida do Norte na língua oficial do reino. Em breve, começaria o processo de criação de uma norma escrita. Mas essa já é outra história…[5]

Referências e notas

Este artigo é baseado numa secção do meu livro O Galego e o Português São a Mesma Língua?, publicado pela Através (Wook / Fnac). A parte inicial do capítulo aqui reproduzido foi publicada nesta página com o título: «Pequena História das Línguas». O mapa é baseado no mapa preparado por Miguel Durán para o livro.
[1] Há mais línguas latinas, mas deixei apenas alguns exemplos. Em dálmata — uma língua já desaparecida — a palavra era «amaur». Referi essa língua no artigo «O que perdemos quando morre uma língua?»
[2] Há vários livros sobre o indo-europeu. Um volume que uso, por vezes, é Indo-European Language and Culture: An Introduction (John Wiley & Sons, 2011), de Benjamin W. Fortson IV.
[3] O basco já foi personagem destas paragens em muitos artigos. Proponho o seguinte: «Qual é a língua mais antiga do mundo?»
[4] Há uma pequena região da Catalunha onde o occitano é língua oficial, em conjunto com o catalão e o espanhol. Chama-se Vale de Aran e a língua tem, por lá, o nome de «aranês».
[5] Em breve, será publicado um livro de Fernando Venâncio, com um estudo aprofundado sobre a origem da nossa língua.