sábado, 14 de junho de 2014

Os insultos dos pobres meninos ricos.



Ontem publiquei no FB o texto do jornalista Florestán Júnior, e a repercussão foi grande: 576 compartilhamentos e 349 "curtir". Reproduzo aqui o texto e os meus comentários. 
Solidariedade com a mulher, com a ex guerrilheira, com a combatente que foi democraticamente eleita e não merece essa falta de educação dos privilegiados. Agradeço a todos pela divulgação. (JV)

"Onde estavam ontem os políticos que festejaram a escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014? Onde estavam Lula, Sergio Cabral, Eduardo Campos, Aécio Neves, José Serra, Jaques Wagner, Yeda Crusius, Cid Gomes, Carlos Eduardo de Sousa Braga, Wilma de Faria, Roberto Requião, José Roberto Arruda, Blairo Maggi? Onde estava Marina Silva que queria uma sede no estado dela, o Acre? Onde estavam os prefeitos, senadores, deputados, ancoras de televisão e rádio que queriam tanto a Copa do Mundo? Onde estavam os prefeitos e governadores responsáveis pelas obras exigidas pela Fifa? Ontem, coube a uma unica mulher receber toda a agressão de uma torcida rica e privilegiada que conseguiu ingressos para o jogo de abertura em São Paulo. Uma elite raivosa que não perde a chance de destilar seu ódio de classe, seus preconceitos e sua falta de educação. Parabéns, presidenta Dilma, você não se escondeu nos palácios da República como fizeram os governadores, inclusive o senhor Geraldo Alckmin".

FLORESTAN FERNANDES JÚNIOR, jornalista.



Nos 500 anos mandando no Brasil as nossas classes dirigentes fizeram do país um modelo do atraso do 4º mundo. Cheguei no Brasil em 1979, e era pouco mais do que uma república bananeira, governada por generais boçais sem voto, ditadores assassinos e ignorantes que, como Figueiredo, que diziam “preferir o cheiro de cavalo ao cheiro de povo“. Aí finalmente o povo escolhe um governo que faz o Brasil avançar, alça o país à categoria de 7ª economia do mundo, leva o PIB  de 1 para mais de 2,4 trilhões em uma década, arranca 40 milhões de brasileiros da pobreza. Nasce uma classe média de mais de 90 milhões com melhores empregos, cursos universitários, rendas mais alta, carteiras assinadas e contas no banco. Avanços enormes em uma década! Mas a Globo e a Veja, conservadores e mentirosos, criam um clima de "beira do abismo". Os que só se informam pela Veja não lembram do nosso passado medíocre, tão recente. Pobre gente burra!

É triste de ver tanta ignorância: xingaram a mulher, a ex guerrilheira, e não criticam os políticos Opus Dei que governam São Paulo há duas décadas, deixam a população sem água, roubam no metrô que avança feito minhoca, põem a USP em situação de falência, reprimem protestos sociais do modo mais ditatorial. Vergonha de essa "elitezinha" que 10 anos atrás ia ao Paraguai comprar whisky falsificado e agora se faz de especialista em vinhos. Vergonha desses que não passam uma nota fiscal nem que a vaca tussa, mas criticam descaradamente a corrupção; aumentam descabidamente os preços dos serviços, mas gritam pela "inflação galopante". 
Sinto vergonha desses covardes, que criticaram a copa, pagaram R$ 900,00 para o jogo de inauguração e xingam a mulher que nos governa, com o voto popular e democrático, como jamais teriam se atrevido a insultar aos militares assassinos dos anos 60 e 70.

 Não é necessário ser petista para avaliar os progressos sociais que trouxe este governo. O PT é hoje um movimento socialdemocrata de centro-esquerda, num governo em que manda só um 40, 45%, com uma maioria do PMDB, em que o centro-direita impõe políticas conservadoras e desenvolvimentistas. Mas o que já foi feito pelas frestas, em termos de políticas sociais, nunca se fez no país antes. Esse crescimento exponencial da economia e das classes médias, que nem a Globo com seus infográficos mentirosos consegue ocultar, favoreceu muita gente, muitos pobres e miseráveis que jamais tinham sido contemplados antes. 

O ódio contra a Dilma é reacionário, aponta ao passado guerrilheiro, valente, comprometido, e a natureza feminina da presidenta; é o machismo nojento dos coronéis, expressado sem pudor pelos filhos de uma classe média que nunca lutou pelos seus direitos, nunca batalhou uma única conquista, e tem raiva de quem luta e consegue, quem se compromete e põe a própria vida a risco para chegar a onde chegamos. 

É que, no fundo e sempre, a história política transparece nas escolhas das pessoas: os eleitores do Ademar de Barros ficaram velhos e os seus filhos passaram a votar no Maluf e no Collor e, coincidentemente, foram os mesmos que votaram no Jânio pra prefeitura, contra o FHC em 1986. O discurso dessa massa -muitos da classe média baixa paulista e paulistana- era e é sempre o mesmo: falta de segurança contra os marginais, críticas aos que defendem os direitos humanos, ao direito sindical a greve e ao protesto de rua, além de um ranço -antes público, agora apenas doméstico- racista e de despreço pelo povo nordestino. 

Essa tendência ideológica, que em todas partes do mundo, desde a Revolução Francesa, se chama de "direita", ou pelo menos de "conservadora", foi a que nos últimos 26 anos, ante qualquer risco do PT ou as esquerdas ganharem, acabam se alinhando numa frente bastante coerente no discurso: os latifundiários do agro-negócio deixam de representar qualquer perigo para eles, e o inimigo dessa massa obscura de baixa classe média passam a ser os Sem Terra. A história universal do capitalismo conta que, sem reforma agrária, não há desenvolvimento nacional -dentro do capitalismo, claro. França, Alemanha, Inglaterra e EUA fizeram as suas reformas agrárias. No Brasil, quem quer reforma agrária é chamado de "vagabundo" por esta massa obscura da classe média baixa em ascensão. Não importa se esse conservador votou na UDN no passado, ou vota no DEM ou PSDB hoje, seu discurso será sempre intolerante com qualquer movimento de pobres e excluídos no presente: sem-terra, sem-teto ou sindicalistas serão sempre "vagabundos" para ele. Por que? porque a sua formação ideológica leva o conservador a odiar de morte qualquer tendência popular, de esquerda ou progressista. 

Repito: o atual governo, a meu entender de pessoa interessada em política e que lê bastante mais do que a Veja e o Readers' Digest, é que este governo é uma coalizão em que o PT (movimento socialdemocrata de centro-esquerda) tem apenas o 45%, e o resto, ou a maioria, é do PMDB, de centro-direita, e dos partidos aliados da direita (PP,PSD e PR). Mas, apesar dos fortes interesses conservadores que apostaram no Lula dez anos atrás, o que fomenta o ódio feroz da direita são as políticas populares, de integração social; nada que qualquer país capitalista decente -como os governados pela socialdemocracia europeia do norte- não possam fazer; mas essa direita conservadora -a mesma que foi a base do golpe de 64- pensa que isso é bolchevismo, política de sovietes, e outras besteiras que a história política desmente em menos de dez minutos de polêmica.

O que não evita -para isso está a política e o oportunismo eleitoralista da atual direita, através do partido da ordem, o PSDB- que esse ódio contra o Bolsa Família, Minha Casa, Pro Uni, etc. vire "bandeiras" da oposição ao atual governo "populista". Ou por acaso o PSDB vai tirar algumas dessas enormes conquistas populares dos últimos 10 anos? claro que não. O problema é muito claro: os programas da oposição e do governo atual podem até se parecer, porque no fundo, PT e PSDB são apenas irmãos simétricos, um mais à esquerda e democrático, o outro mais à direita e liberal, mas não muito longe do centro. 

O problema é a ideologia: quem xinga a Dilma jamais teria ousado levantar a voz contra um general, ou até discutir contra um mero tenente, nas épocas ferozes da ditadura. Enquanto isso, os que desaprovamos a repressão feroz do Alkimim contra os protestos sindicais ou sociais, jamais deixamos de criticar o desenvolvimentismo da Dilma y do seu grupo no PT. Os que criticamos sem pelos na língua as falcatruas do grupo do Dirceu, (que usou os mesmos métodos do FHC na época da votação pela sua reeleição) somos os mesmos que exigimos que seja investigado o Mensalão Mineiro com o mesmo fervor e entusiasmo global que foi investigado o Mensalão petista. Os que exigimos que se investiguem de verdade as negociatas do governo de São Paulo com os trens e o metrô, somos os mesmos que criticamos a insensibilidade da Dilma com os povos indígenas que vão ser despejados do Xingu por causa das hidroelétricas. Os que detestamos a figura autoritária e oportunista do Joaquim Barbosa, somos os mesmos que pedimos liberdade de protesto -em qualquer estado, não importa quem o governe- e que se acabe com as truculências das PMs. Os que lutamos contra a escravidão das drogas, somos os mesmos que aplaudimos tanto o estado de SP com o seu programa Renascer, como a PMSP com o seu Braços Abertos -sem distinção de partidos- e somos os mesmos que deploramos as negociações do nosso governador Opus Dei com o PCC. 

Para entender o que acontece hoje no país, é necessário entender não só o que se passou do Getúlio até aqui, mas desde os Bandeirantes e suas políticas genocidas, ou desde os Pedros e suas ações imperialistas que os levaram a invadir o Uruguai e o Paraguai. E para isto, é claro, se necessita pegar nos livros, queimar os cílios e tomar partido.

JV. São Paulo, 13 de junio de 2014.

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