segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Creio que eu também a vendi algumas vezes


Creio que eu também já a vendi algumas vezes antes

Você sabe muito bem, Sr.Villanueva, sem dúvida alguma, e não tente me enganar; você sabe que venderia sua alma ao diabo para voltar a ter 28 anos de novo. Mas quando chega a hora da verdade, o momento tão esperado, você se lembra que talvez já a tenha negociado antes, em alguma outra ocasião. 
E é por isso que agora, mesmo ainda querendo vendê-la ao homenzinho que apareceu do nada em sua casa com uma estranha garrafa, já não pode mais. E desesperado, você, Villanueva, revira os armários, abre todas as gavetas da cómoda, e vira de ponta-cabeça inclusive a biblioteca, para ver se, por acaso, encontra alguma coisa com a qual possa voltar a ter 28 de novo. 
Pensa que já não tem nada a oferecer-lhe e se pergunta que outra coisa pode querer aquele homenzinho cinza, o mesmo que já tinha lhe comprado a alma na outra ocasião, trinta anos atrás. 
Por isso procura desesperadamente em todos os lugares, e repete para si mesmo que quer encontrar algo, alguma coisa de valor, o que seja, o que for, enquanto continua fuçando nos armários, revirando as gavetas, e dando voltas e mais voltas na pilha de livros antigos da biblioteca; mas continua sem encontrar nada de algum valor que se possa vender. 

O que seja! Qualquer coisa, o que seja, o que seja, para voltar a ter 28 anos! E se encontra com um caderninho velho, um Laprida de capa dura, de cor creme, ou verde claro; e dentro do caderno, colada com goma arábica, a poesia ingênua que lhe escreveu a sua primeira namorada; aparece também o anel de formando, de puro ouro 18 quilates que lhe presenteou a sua mãe; uma radiografia de quando lhe operaram o nariz, que quebrou com treze anos, jogando futebol em Córdoba; a pilha de discos que Diego gravou para você (o Julito, lembra?) antes de ir para o exílio na Itália; e vai colocando tudo no monte de coisas que poderia vender em troca de voltar a ter 28 anos de novo. 
E coloca tudo nesse montinho porque, mesmo que tenham importado naquela época, agora já não interessam tanto. Algumas dessas coisas, com exceção do anel, já não passam de bugigangas. Só importa agora voltar a ter 28 anos. 
Qualquer coisa de valor, o que seja, qualquer coisa, o que seja, o que for! E Javier se pergunta a quem podem interessar essas coisas, que nem a ele mesmo já lhe interessa muito; e por isso continua bisbilhotando nos armários, dentro das gavetas, até debaixo da cama, nas escrivaninhas da mulher e das crianças, e continua juntando tudo no montão das coisas que pode vender, para voltar a ter 28 anos. 
E lê no Laprida

“Pouco tempo depois do enterro do meu velho, cruzei na rua, por acaso, com o Dr. Cordero, que tinha sido seu médico de cabeceira. Tomamos um café na confeitaria La Paz, e o velho médico acabou me contando que em 1976, ou talvez um ano antes, ele tinha dito ao meu pai que tinha um rim muito afetado e que também devia começar a se cuidar de verdade da diabete. 
A resposta do meu velho tinha sido que entre passar oito ou dez anos sem açúcar, ou sobreviver apenas mais um ou dois, levando a vida que ele realmente gostava, ele preferia a segunda opção. Ou seja, que morreria como havia vivido, tal e qual, com as botas postas. 
Conhecendo o meu pai, o médico não se surpreendeu com que ele tenha me ocultado aquele momento de sua vida e as recomendações que tinha recebido. Apesar do rim afetado, a diabete e os pulmões que começavam também a ficar ruins, meu pai mostrava um enganoso ótimo aspecto, e uma figura trapaceiramente saudável, e durou ainda mais algumas décadas. 
Arrumando os livros e a correspondência na oficina do velho, alguns meses depois de sua morte, e tendo que decidir o que ia guardar ou jogar fora, dei de cara com nove cadernos Laprida, escondidos na estante mais alta da biblioteca. Eu sabia que entre 1967 e 1969 o meu pai tinha tentado escrever uns contos, dentro de uma obra maior – mais atrevida, pode-se dizer - uma novela ou romance curto de ficção; ou melhor, uma proto-novela. Os cadernos eram os mesmos que eu tinha visto naquela época. Ainda me lembro bem da noite em que meu velho me disse que estava começando a escrever um livro; e também de outra tarde em que veio me pedir alguns conselhos literários, e ao passar, lhe comentei sobre os cadernos; me disse que já estava tentando avançar em uma segunda obra. 
Uns meses depois dessa breve conversa, ao passar pelo velho café da esquina da estação de trens de Ramos Mejía o vi em uma mesinha, escrevendo; meu velho estava encurvado, com o olhar perdido e ao mesmo tempo concentrado em seu manuscrito, enquanto o galego Leiva, o brigão, o observava e lhe dava uns tapinhas nas costas com a cumplicidade de um velho camarada de lutas. 

Meu pai tinha conseguido realizar algumas poucas façanhas, pouco reconhecida também, talvez por serem coletivas, feitos de toda uma geração, em sua longa vida; como todos, teve sonhos e diversos pesadelos; sobreviveu aos violentos anos 70 e à perda de alguma das suas ilusões; teve uma memória, venceu o esquecimento, conheceu os heróis e canalhas de seu século e do anterior, o dos pró-homens da América; derrotou a morte pelo menos duas vezes, uma, ao sair da pátria e encontrar uma longa trégua; a segunda, outros tantos anos depois, ao vencer o coma e sair do estado de latência pelo qual passou durante quase um ano em Córdoba. Só não conseguiu realizar um sonho: escrever sua segunda novela ou romance curto; na verdade a primeira não havia interessado a nenhum editor e os leitores críticos que a analisaram não conseguiram convencê-lo de que não havia nenhuma qualidade literária na arquitetura da obra, e que os textos eram tremendamente confusos. 
Os nove cadernos Laprida continham as memórias de uma longa saga familiar, relatadas por dois avôs meio sábios e fantasmagóricos e multidões de heróis e caudilhos gloriosos e contraditórios que nunca conseguiram levantar em pé a pátria grande que sonharam. Nove Lapridas cheios de pesadelos, sonhos e frustrações". 

Dizem os vizinhos da estação de Ramos Mejía que o Diabo, depois de tanta enrolação do Javier, tanto blablá desconexo, por fim não levou nada e, furibundo, se lançou pra dentro de uma fenda e desapareceu entre as rochas que suportam os túneis por debaixo da linha do trem. Pode ser tudo mentira do Negro Unzaga que me contou a história, mas é bem provável que isto tenha acontecido. 

Leia mais em: "Crónicas de Utopías y Amores, de Demonios y Héroes de la Patria" (JV, 2006)

sábado, 4 de dezembro de 2021

El amor político y el odio de los insensatos



El amor político y el odio de los insensatos

Por Sandra Russo de Página/12

“Con odio has vivido y con odio has muerto”, fue el tuit de un municipio de Madrid, a cargo de Vox, para despedir a Almudena Grandes, que en su obra vivificó los dramas republicanos que permanecieron invisibles. Aquí, allá y en todas partes los reaccionarios están embebidos, lubricados con el odio. Sólo les son concebibles criaturas ajadas como ellos por ese rayo que los partió al medio y los dejó con la capacidad de amor atrofiada. No se quieren ni entre ellos.

El auge de los discursos de odio no es ningún misterio. Podría haber un auge del amor si el poder real fuera de los humildes y lo que no derrama brotara de la tierra. Brota, pero la tierra es de quienes se declararon sus dueños. Y como no aman, ni a quienes habitan la tierra ni a lo vegetal y mineral que vive en ella, odian, incendian, matan. O mienten, desprestigian, cancelan...

Pero hablemos de amor. Se habla poco de amor, porque estamos todo el tiempo hablando de odio, incluso para descifrarlo. En general solamente surge la primera acepción, la erótica o romántica, inflada como una pelopincho con motor por la cultura de masas. Luego se añaden otros amores intensos, los hijos, los padres, un club, los amigos, un sabor, un olor que al estilo de Proust es un puente hacia los que fuimos antes y ya no existen, aunque perduran de mil formas en los que somos.

Pero el amor político, ¿qué es? Porque enfrentamos el odio político, no el odio a secas, y no voy a caer en la frase que sabemos todos, porque tiene una lectura lineal que la hace parecer ingenua. No lo es. Porque amemos a los otros o a esta tierra, no venceremos por amar, sino en todo caso por pelear por lo que amamos.

Los discursos del odio son una anteojera que les ponen los miserables a los amargos que nunca se deleitaron en su vida con nada que no sea caro, por un lado, y por el otro a los que nunca se deleitaron con la vida en general, los que vivieron resentidos, acomplejados, incompletos porque nunca se arriesgaron para rozar aunque sea unos segundos la epifanía del amor colectivo.

A lo largo de la historia, los grandes y buenos pasos hacia formas civilizatorias --por esto entiendo aquí nuevos contratos sociales que acotaron en cualquier escala el volumen de dolor de grandes sectores de la población--, se dieron por amor. Siempre hubo víctimas que elaboraron su sufrimiento como el resultado de un orden que había que cambiar. Los esclavos, los vasallos, las mujeres, entre tantxs. Y siempre a esas víctimas se les sumaron muchxs que se convirtieron en víctimas por elegir pelear ahí abajo.

Es mentira que nuestra naturaleza es el odio. Es mentira que para odiar hay que tener coraje. El odio es el camino recto y el amor es el surco que da vueltas y se bifurca y vuelve a convertirse en el camino: es instinto y a la vez conocimiento. El odio sale como un eructo. El amor es una construcción delicada y susceptible a los vientos en contra o a los vaivenes pasionales. Para odiar hay que dejarse llevar. Para amar, hay que sobreponerse.

El odio ha sido el instrumento de los tiranos y los mediocres, los extraviados y los desbordados de poder. Uno creyó que era rey porque lo había decidido Dios. Otro mató a millones porque fabuló una raza nórdica con estaturas que jamás tendrían los alemanes, ni los más rubios hubiesen sido nunca tan altos como en su delirio.

La historia está llena de odio, sí, pero no menos que de amor. El amor político, el que se siente por quien se conoce o no, el que trasciende un vínculo personal pero es tan personal como el deseo, toma ese rumbo porque no hay otro posible para su hazaña que tomar impuso y sobrevolar el odio: el amor político se llama causa. Cuando se ama políticamente, cuando todavía se está en el mundo sólido de las ideas y no en la gansada líquida de los programas con más rating, que ahora entretienen con odio, el amor es una causa.

Una causa que puede ser muy sencilla. Por ejemplo: que a los de más abajo les toque por fin el número, que los llamen por su nombre y apellido, que dejen de tener miedo, que sobrelleven su pobreza y que la pobreza sea un estado y no un destino, que una red intangible los libre de la miseria. Eso se dice fácil y lo dice cualquiera. Pero si uno se lo toma en serio, es sólo con amor por esa idea que se abandona el tiempo propio y los intereses propios y las ventajas propias y los cálculos propios. Hay de todo y mezclado. Pero el que de verdad ama esa causa, debe estar dispuesto a perderlo todo, y por amor. Ejemplos hay, de hombres y mujeres que nos han amado y a quienes les correspondimos. Pero esa clase de personas no espera retribución: hace lo que tiene que hacer ontológicamente, haciéndolo son ellos y ellas del todo.

Ese amor viene con nosotros. Nace con nosotros. El mundo nos espera, cuando nacemos, para desmentirlo, para convencernos de que Caín triunfa sobre Abel. Pero nunca han logrado extirpar el amor colectivo, ni su paradoja ni su semilla. No podrán nunca porque la paradoja es la que los enloquece: no se ama por conveniencia, sino por disposición. Los que odian siempre serán más rudimentarios, más mediocres que los que aman. Y lo saben, y no lo soportan.

domingo, 14 de novembro de 2021

Alvar Núñez Cabeza de Vaca, desnudo y transformado en otro hombre

 


Alvar Núñez Cabeza de Vaca, desnudo y transformado en otro hombre

Quién lo vio llegar a México no podia creerlo: piel y huesos, desnudo como vino al mundo, y quemado a tal punto de no poder decirse a ciencia certa si se trataba de un indio o un negro, jamás un español. Además, lo acompañaban silenciosos un hombre especialista en lenguas al que llamaban “el Negro”, de Marruecos, y dos soldados.

Pero sí, Alvar Núñez Cabeza de Vaca pertenecía a la rara estirpe de ambiciosos guerreros de armadura, yelmo, ballesta y arcabuz que llegaba al Nuevo Mundo en busca de tierras, gloria, oro y, claro, mano de obra esclava para convertirla em fieles cristianos, laboriosos y calados.

Así había llegado a la Florida, ocho años atrás, pero salía ahora derrotado del vasto desierto del norte de México y sur del actual Estados Unidos.

Más tarde, en Naufragios, Alvar Núñez Cabeza de Vaca cuenta las vicisitudes de los únicos cuatro sobrevivientes de la expedición de Pánfilo de Narváez a la Florida en 1527, viviendo entre los indios durante ocho años, a veces como esclavos, otras como comerciantes y curanderos, y cómo atravesaron a pie el suroeste de los actuales Estados Unidos y norte de México hasta que en 1537 pudieron volver al territorio controlado por España, la colonia de Nueva Galicia del Virreinato de Nueva España.

Distinto de otros textos que relatan la conquista de América, en Naufragios de Alvar Núñez Cabeza de Vaca, un texto fundamental para entender la conquista de América, lo que vemos es una expedición fracasada, que según su objetivo original, debería haber sido un gran éxito para España y su plan de colonización.

La enorme y sufrida travesía de Alvar Núñez entre el actual territorio de los EEUU y México no es solo un traslado geográfico, sino un cambio total de metas y de objetivos. Es una travesía épica que significa el paso de una cultura hacia otra. Es, en definitiva, un traslado de un yo (y un nosotros) español, ibérico, conquistador, hacia otro distinto, un Alvar Núñez errante, un andarillo desnudo que se parece más a un nativo hambriento y debilitado que a un español victorioso.

A medida que los sucessivos naufragios, el hambre y las enfermedades se suceden, el individuo Alvar Núñez se aleja cada vez más de su grupo de fieros conquistadores españoles victoriosos y se acerca al que él consideraba su opuesto desde su llegada a la Florida porque ve la urgencia de sobrevivir. Alvar Núñez entiende que el Nuevo Mundo ya no es más lo que había esperado como conquistador, y que para sobrevivir precisa de la ayuda de los nativos. El objetivo de su expedición cambia de pronto. Ya no busca más las riquezas de Eldorado ni la promesa de vida y virilidade eterna em la Fuente de la Juventud, o la gloria, porque sse es apenas el momento de sobrevivir.


Javier Villanueva, Catamarca, agosto de 2001.

 


sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Mil ochocientos y tanto. Por Luis Unzaga

 


Mil ochocientos y tanto

As lendas e mitos da Catamarca vem de longe, da época em que os espítitos dos Diagüitas vagavam pela noite afora; dos anos posteriores à conquista espanhola quando, fugindo dos incas, a grande nação índia dos Quilmes caiu nas mãos dos aventureiros ibéricos. E os “adelantados” decidiram levar o povo guerreiro a pé, dos Vales Calchaquíes até a longínqua Buenos Aires, a mais de mil quilômetros de distância, e confiná-lo numa “reducción”, para que parassem com essas idéias de querer ser livres e trabalhar a terra que tinha sido dos bisavôs dos seus avôs.

Mas em Catamarca, e sobre todo em Las Chacras, ao redor de San Antonio de Fray Mamerto Esquiú, Don Victoriano Unzaga e Doña Eufemia Valentina Arce -galhos fortes de uma estirpe que vinha dos bascos franceses e espanhóis, de um lado, e de andaluzes do outro- não tiveram medo de espíritos e almas em pena. Las Chacras, casa e sítio dos velhos, vizinha dos Ávalos, floricultores, e dos Ovejero, criadores de gado  e leiteros foi durante o século vinte o centro das alegrias de uma enorme família. Mais de cento e quarenta anos atrás à data de hoje, tropas rebeldes de Felipe Varela e Chacho Peñaloza, “montoneros” federalistas, guardavam suas armas e faziam entreposto para descanso e troca de animais, na que agora é a casa da Gringa e seus irmãos e irmãs. 

Luis Unzaga, lembrando o Macondo de Catamarca, descreve a casa paterna com o olhar da criança que setenta anos atrás se assombrava com as histórias de Don Victoriano. (JV.)

Las Chacras. 

Mil  ochocientos  y   tantos;  ¿era una posta? ,  ¿o un apeadero  de  viajeros  que  venían  del  norte  o  del  sur?  Potreros, corrales,  alimento de  recuas  de  mulas. Sombra de  añosos  eucaliptos, la vieja y famosa tipa de la entrada de Las Chacras, el pino  y algunas  higueras.  

Descanso  de  carretas  y  bueyes, desmonte  de  arrieros,  de  montoneros  con sus  chuzas  y   lanzas.    Posibles  hechos  ocurridos  que  no  están  en  la  historia.  Tal vez  de  aquel  que  no  pudo  escapar  del castigo de  las  estacas, o el  tormento del cepo.  De  ese  amor   apasionado e imposible  que  terminó  en la cruz del acero.  Quedaron   guardados  en  huecos,  escondidos  en  grietas  de  viejas  paredes  entre  las  cenizas  y  el  hollín  de  antiguos  fogones .   Aquellos  viajeros  se  fueron  ¿y  nunca  más volvieron?,  el  tiempo  pasó.    De   lo que  fue,  quedó  una  casa  de  grandes  adobes, estribos  esquineros, techos  de  caña,  una  galería  un  galpón  y los restos  de  cimientos  de  otras   estancias.    Quizás  las razones  de  hechos  más  nuevos, ¿quién lo sabrá algún día? 

Como  el  de  los  ruidos  que  todos  oían  detrás  de  la  casa, de tumbos  de  troncos  pesados  que  nadie  movía.  Manos  invisibles  golpeando  la  puerta  que  daba  a  los  fondos,   o   el  de  aquella  noche  de  tanto  alboroto  de  gallos  y gallinas;  pensando  en ladrones, un zorro  o  una comadreja  los  hombres  salían  y  nada, todo el gallinero en  calma dormía. 

Todas  éstas  cosas  pasaban  en  noches  de  invierno  cuando  se congelaba  el  silencio.   Como  el  silbo  distinto  de  almas  en  pena, sonando  por  aquí  y más  allá.  Pobre  de  aquél  que  imitando  ese  silbido, cada  vez  lo  sentía  más  cerca;  el  ultimo  vibró  en  sus  oídos,  dejándolo  sordo.

Luis  Unzaga. Catamarca,  11 / 2011

sábado, 6 de novembro de 2021

O'Higgins y la autonomía del pueblo Mapuche



O'Higgins y la autonomía del pueblo Mapuche

Antes de educarse en Lima o Inglaterra, Bernardo O’Higgins Riquelme, Padre de la Patria chilena,  estudió en el Colegio de Naturales de Chillán, actual Colegio San Buenaventura. A este colegio construido por los jesuitas en 1697, y regido por los franciscanos desde 1786, asistían obligatoriamente los hijos de los caciques Mapuche de la zona (Chillán, Los Ángeles, Concepción).

Los colegios naturales eran conventos y los niños permanecían internados. O’Higgins tuvo de compañeros de curso a los hijos de los lonkos, con quienes estudió, durmió, comió, jugó y aprendió la lengua Mapuche, el mapudungún, y seguramente las historias de los héroes de sus amigos, como el joven cacique Lautaro.

Esta faceta poco conocida de la vida de O’Higgins fue determinante para que, siendo ya Director Supremo del Estado de Chile, enviara a los lonkos y caciques del sur la siguiente carta, de marzo de 1819, que vale la pena revisar:


"El Supremo Director del Estado a nuestros hermanos los habitantes de la frontera del Sud.

Chile acaba de arrojar de su territorio a sus enemigos después de nueve años de una guerra obstinada y sangrienta. Sus fuerzas marítimas y terrestres, sus recursos y el orden regular que sigue la causa americana en todo el continente, forman un magnífico cuadro, en que mira afianzada su Independencia.

Las valientes tribus de Arauco, y demás indígenas de la parte meridional, prodigaron su sangre por más de tres centurias defendiendo su libertad contra el mismo enemigo que hoy es nuestro. ¿Quién no creería que estos pueblos fuesen nuestros aliados en la lid a que nos obligó el enemigo común? Sin embargo, siendo idénticos nuestros derechos, disgustados por ciertos accidentes inevitables en guerra de revolución, se dejaron seducir de los jefes españoles. Esos guerreros, émulos de los antiguos espartanos en su entusiasmo por la independencia, combatieron encarnizadamente contra nuestras armas, unidos al ejército real, sin más fruto que el de retardar algo nuestras empresas y ver correr arroyos de sangre de los descendientes de Caupolicán, Tucapel, Colocolo, Galvarino, Lautaro y demás héroes, que con proezas brillantes inmortalizaron su fama.

¿Cuál habría sido el fruto de esta alianza en el caso de sojuzgar los españoles a Chile? Seguramente el de la pronta esclavitud de sus aliados. Los españoles jamás olvidaron el interés que tenían en extenderse hasta los confines del territorio austral. Sus preciosas producciones, su incomparable ferocidad, y su situación local, han excitado siempre su ambición y codicia. Con este objeto han mantenido continua guerra contra sus habitantes, suspendiéndola sólo cuando han visto que no hay fuerza capaz de sujetar a unos pueblos que han jurado ser libres a costa de todo sacrificio. Pero no han desistido de sus designios, pues en los tiempos que suspendieron las armas fomentaron la guerra intestina, para que destruyéndose mutuamente los naturales, les quedase franco el paso a sus proyectos. Entre tanto el comercio no era sino un criminal monopolio; la perfidia, el fraude, el robo y en fin todos los vicios daban impulso a sus relaciones políticas y comerciales.

Pueblos del Sud, decidme si en esto hay alguna exageración; y si por el contrario apenas os presento un lisonjero bosquejo de la conducta española, convendreis precisamente en que dominando España a Chile, se hubiera extendido sobres vuestros países como una plaga desoladora, concluyendo con imponeros su yugo de fierro que acaso jamás podríais sacudir.

En el discurso de la guerra pensé muchas veces hablaros sobre esto, y me detuve porque conocí que estabais muy prevenidos a cerrar los oídos a la voz de la verdad. Ahora que no hay un motivo de consideración hacia vosotros, ni menos a los españoles, creo me escucharéis persuadidos de que sólo me mueve el objeto santo de vuestro bien particular y del común del hemisferio chileno.

Nosotros hemos jurado y comprado con nuestra sangre esa Independencia, que habéis sabido conservar al mismo precio. Siendo idéntica nuestra causa, no conocemos en la tierra otro enemigo de ella que el español. No hay ni puede haber una razón que nos haga enemigos, cuando sobre estos principios incontestables de mutua conveniencia política, descendemos todos de unos mismos Padres, habitamos bajo de un clima; y las producciones de nuestro territorio, nuestros hábitos y nuestras necesidades respectivas no invitan a vivir en la más inalterable buena armonía y fraternidad.

El sistema liberal nos obliga a corregir los antiguos abusos del Gobierno español, cuya conducta antipolítica diseminó entre vosotros la desconfianza. Todo motivo de queja desaparecerá si restablecemos los vínculos de la amistad y unión a que nos convida la naturaleza. Yo os ofrezco como Supremo magistrado del pueblo chileno que de acuerdo con vosotros se formarán los pactos de nuestra alianza, de modo que sean indisolubles nuestra amistad y relaciones sociales. Las base sólidas de la buen fe deben cimentarlas, y su exacta observancia producirá la felicidad y seguridad de todos nuestros pueblos. Se impondrá penas severas a los infractores, que se ejecutarán a vista de la parte ofendida, para que el ejemplo reprima a los díscolos.

Nuestras Escuelas estarán abiertas para los jóvenes vuestros que voluntariamente quieran venir a educarse en ellas, siendo de cuenta de nuestro Erario todo costo. De este modo se propagarán la civilización y luces que hacen a los hombres sociales, francos y virtuosos, conociendo el enlace que hay entre los derechos del individuo y los de la sociedad; y que para conservarlos en su territorio es preciso respetar los de los pueblos circunvecinos. De este conocimiento nacerá la confianza para que nuestros comerciantes entren a vuestro territorio sin temor de extorsión alguna, y que vosotros hagáis lo mismo en el nuestro, bajo la salvaguardia del derecho de gentes que observaremos religiosamente.

Me lleno de complacencia al considerar hago estas proposiciones a unos hombres que aman su independencia como el mejor don del Cielo; que poseen un talento capaz de discernir las benéficas intenciones del pueblo chileno; y que aceptándolas, desmentirán el errado concepto de los europeos sobre su trato y costumbres,

Araucanos, cunchos, huilliches y todas las tribus indígenas australes: ya no os habla un Presidente que siendo sólo un siervo del rey de España afectaba sobre vosotros una superioridad ilimitada; os habla el jefe de un pueblo libre y soberano, que reconoce vuestra independencia, y está a punto a ratificar este reconocimiento por un acto público y solemne, firmando al mismo tiempo la gran Carta de nuestra alianza para presentarla al mundo como el muro inexpugnable de la libertad de nuestros Estados. Contestadme por el conducto del Gobernador Intendente de Concepción a quien he encargado trate este interesante negocio, y me avise de nuestra disposición para dar principio a las negociaciones. Entre tanto aceptad la consideración y afecto sincero con que desea ser vuestro verdadero amigo.


Bernardo O’Higgins R.

SANTIAGO, Sábado 13 de Marzo de 1819".

(Fuentes: Educar Chile y Mapuexpres)


sábado, 25 de setembro de 2021

A Revolução Cubana, a Sandinista e o socialismo pacifista do chileno Salvador Allende

A Revolução Cubana, a Sandinista e o socialismo 
pacifista de Salvador Allende



Três grandes momentos revolucionários na América Latina do século XX

(Arquivo oferecido aos alunos do Curso Espejo Enterrado)


Depois da Revolução Mexicana - que na realidade foram duas, simultâneas- as revoluções Cubana e Sandinista, e a tentativa frustrada no Chile de Allende, representam projetos que vamos a analisar em suas semelhanças e diferenças: 

A Revolução Cubana foi um movimento popular, que derrubou o governo do presidente Fulgencio Batista, em janeiro de 1959. Como consequência do processo revolucionário, foi implantado em Cuba o sistema socialista, com um governo liderado pelos dirigentes do movimento revolucionário: os irmãos Fidel e Raúl Castro, o Che Guevara e Camilo Cienfuegos, que morreu pouco antes da constituição do governo popular.

A Revolução Sandinista foi uma revolução popular ocorrida na Nicarágua entre 1979 e 1990, dirigida pela Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) - chamada assim em memória ao líder nacionalista Augusto César Sandino, que depôs o então presidente Anastasio Somoza Debayle. A FSLN liderou a primeira revolução em que se aliaram o cristianismo de libertação e os intelectuais marxistas, e governou o país durante onze anos.

O Governo Allende. Em 1970 Salvador Allende foi eleito presidente do Chile pela Unidade Popular. Esse agrupamento político era formado por socialistas, comunistas, setores católicos e liberais do partido Radical e do Partido Social Democrata, e contava com grande apoio dos trabalhadores urbanos e dos camponeses. O governo Allende pretendia construir uma sociedade socialista em liberdade, pluralismo e democracia, respeitando as instituições burguesas e sem violência popular, e estava comprometido com o processo de nacionalização da economia, a reforma agrária e a elevação do nível de vida dos trabalhadores. Allende e a UP acreditavam que as reformas sócio econômicas graduais iriam fortalecer as massas trabalhadoras e ao mesmo tempo destruir o predomínio econômico e imperialista, a caminho da construção de uma sociedade socialista.

Durante o primeiro ano de governo ocorreram importantes mudanças, como a reforma da Constituição de 1971, que passou a considerar como propriedade do estado todas as riquezas do subsolo, o que incluía o cobre, uma das fontes principais de ingressos das classes dominantes chilenas e seus sócios no exterior. No entanto, as pressões do imperialismo e das elites chilenas passaram a ser mais sentidas a partir do ano seguinte, com o lock-out dos proprietários de caminhões, responsável pela grave crise de abastecimento que se seguiu, e uma série de boicotes contra o governo popular. A importante vitória da Unidade Popular em 1970 e as medidas progressistas do governo desde então, porém, não eram garantia de poder completo e total, uma vez que as demais instituições do estado - o Congresso e o Poder Judiciário - continuavam controladas com punho de ferro pela burguesia. As forças da esquerda exigiam maior radicalização para superar os obstáculos, enquanto que os setores conservadores do próprio governo pediam maior flexibilidade para salvar as dificuldades. Nesse sentido Allende incorporou ao ministério alguns militares legalistas, conseguindo uma estabilidade institucional transitória, o que permitiu a Unidade Popular vencer nas eleições para o Congresso Nacional de março de 1973.

A partir de junho desse ano, porém, a reação conservadora ficou mais intensa, produzindo levantes militares, diversos atentados terroristas, greves e lock-outs patronais. Existiam também as diversas visões internas dentro do governo, uma vez que a Unidade Popular era uma frente política de vários partidos e tendências diferentes da esquerda. Enquanto o Partido Comunista defendia a via pacífica para o socialismo, apoiando as táticas de Allende, o MIR (Movimento de Izquierda Revolucionário) realizava maior pressão pela radicalização, e preparava ações armadas em vista de um processo violento de defesa do poder popular. Havia no Chile uma ilusão com as Forças Armadas, já que, na história do país quase que não haviam interferido diretamente no processo político. 

A Doutrina Truman e o medo a Revolução Cubana, porém, fizeram com que núcleos fascistas crescessem dentro da estrutura militar que, apoiada pelos EUA seria a responsável pelo golpe de 11 de Setembro, que derrubou o governo popular. O golpe começou em Valparaíso com o levante da Marinha no dia 11 de setembro com a adesão, em Santiago, das três armas e do Corpo de Cabineiros, comandados pelo general Augusto Pinochet. Os confrontos terminaram em massacre nos bairros operários e nas fábricas ocupadas, com cerca de dez mil mortos e milhares de prisões; o ataque ao Palácio de La Moneda, onde Allende resistiu e acabou morto, completou a vitória da extrema direita e da CIA sobre as forças populares chilenas.

Semelhanças e diferenças entre a Revolução Cubana e a Nicaraguense

A revolução em Cuba no final da década de 1950 foi resultado de uma insatisfação popular com o longo processo de dependência político-econômica da ilha caribenha em relação aos Estados Unidos, desde a ruptura dos laços coloniais com a Espanha em 1898.

A ascensão de Fulgencio Batista ao comando do Estado cubano, por meio de um golpe, em 1952, instaurou uma ditadura apoiada pelo governo dos EUA, o que agravou ainda mais uma situação de ausência de liberdade política, de democracia efetiva e de condições dignas de existência para a maioria da população. Sucederam-se diversas tentativas políticas de caráter insurrecional contra o regime do ditador Batista, até culminar com o assalto fracassado ao quartel Moncada, em Santiago de Cuba, no ano de 1953, e a organização de atividades guerrilheiras em Sierra Maestra, a partir de 1956, até culminar com a tomada do poder pelos revolucionários, em janeiro de 1959.

A principal figura de oposição a Fulgencio Batista durante todo esse processo, e líder da Revolução Cubana, foi Fidel Castro, que contou com o apoio de distintos segmentos sociais urbanos e rurais, sobretudo destes últimos, insatisfeitos com as condições de atraso econômico e com o autoritarismo governamental amparado por forças imperialistas norte-americanas. Para unir amplos setores da sociedade, o centro de gravidade da revolução ficava, inicialmente, na libertação nacional. Posteriormente, na tentativa de consolidar as premissas da revolução, à concepção de independência da nação se acrescentou a edificação de uma ordem social inteiramente nova, a sociedade socialista. A Revolução Cubana foi marcada pela longa duração, e por uma liderança de um pensamento social e político tão consistente que transfere seus resultados e consequências até as décadas mais recentes. Mas, apesar dos êxitos iniciais do processo revolucionário em relação à conscientização e ao enorme envolvimento político e cultural da sociedade cubana, a partir de 1970, já numa segunda fase, o pensamento social sofreu pelas mudanças das condições internacionais, que provocaram a detenção do seu desenvolvimento, e um grande empobrecimento e tendências internas à dogmatização.

Tudo isso teria resultado no endurecimento do controle do Estado em relação à sociedade, na tentativa de manutenção dos preceitos da revolução diante de um cenário de crescimento das críticas ao comando do governo, cada vez mais vinculado às diretrizes políticas e econômicas dos EUA, que agravaram o bloqueio à ilha e incentivaram a participação crescente dos soviéticos na vida da revolução.

Por sua vez, na Nicarágua, a Revolução Sandinista de 19 de julho de 1979 foi resultado de um acúmulo de forças sociais heterogêneas – tanto camponeses, como operários, e pobres e marginalizados em geral da cidade e do campo, intelectuais e setores progressistas da burguesia nacional – em torno de um objetivo comum: acabar com a ditadura da família Somoza no país, e abrir caminho para a emancipação da sociedade nicaraguense da oligarquia local e do imperialismo dos Estados Unidos. O movimento de caráter popular e anti-imperialista da oposição ao governo de Anastasio Somoza Debayle foi canalizado pelo grupo politicamente mais organizado, a Frente Sandinista de Liberación Nacional. O FSLN dotou a luta popular de uma perspectiva revolucionária, que culminou com a revolução de 1979 e encerrou décadas de ditadura somozista na Nicarágua. O movimento revolucionário se inspirou em Augusto César Sandino, líder guerrilheiro dos anos 1920 e 1930, que combateu contra a ocupação norte-americana no país. Assim como em Cuba, os termos do socialismo na Nicarágua foram adotados ao longo e no transcorrer da rota de desenvolvimento da questão nacional nicaraguense. Também em comum com as estratégias revolucionárias praticadas duas décadas antes em Cuba houve, na Nicarágua, a opção decidida e praticada foipela luta armada, embora na Nicarágua esse processo curto terminasse três anos depois pela via eleitoral.

Tanto a Revolução Cubana de 1959 como a Revolução Sandinista de 1979 tiveram um impacto eletrizante, que repercutiu muito além das fronteiras de ambos os países, levando à proliferação de movimentos socialistas e nacionalistas, a maioria deles armados, em diversas regiões da América Latina, durante as décadas de 1960, 70 e 80. A diferença das ações tomadas contra Cuba, a partir da revolução sandinista, os EUA reagiram ao avanço popular com embargos econômicos e financiaram as milícias armadas dos chamados “Contras”, organização paramilitar formada pelos setores que tinham se beneficiado da ditadura somozista no passado, e organizaram um exército que colocou o país em situação de guerra novamente. 

O financiamento dos “Contras” provocou uma séria crise no governo Reagan que propiciou desvios de recursos não autorizados pelo Congresso. Depois de anos de batalhas, os EUA e o exército mercenário dos Contras conseguiram desgastar o governo popular. A população, cansada de guerra, exigia paz e optou pela articulação conservadora nas eleições de 1990. Um pleito presidencial financiada também pelos estadunidenses e questionada internamente e fora do país. A FSLN se transformou num partido político de esquerda, legalizado e as conquistas da revolução sandinista foram perdidas pela ausência de incentivos ao pequeno agricultor que perdeu as terras conquistadas, pelo aumento da taxa de analfabetismo, o que levou a que os índices de desenvolvimento ficassem no segundo pior da América Latina, a dependência econômica aos EUA, como um país sem soberania. As lições desta revolução mostram as características da luta de classes e do projeto popular numa realidade social em que a democracia foi conquistada às duras penas, mas onde não foi o suficiente para manter um projeto popular e de soberania nacional. Essas duas experiências revolucionárias - a cubana e a sandinista- foram analisadas também por renomados escritores, como Julio Cortázar, Mario Benedetti e Eduardo Galeano.

JV. 2020


segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Lua engana-nos — e tem uma cicatriz no nome.

 

Certas PalavrasPágina de Marco Neves sobre línguas e outras viagens

A Lua engana-nos — e tem uma cicatriz no nome.

Nestas férias, numa daquelas noites de Verão que apetecem e de que já começamos a sentir saudades (e nem Setembro chegou ao fim), o meu filho Matias, de três anos, apontou para a lua cheia e disse, a rir: «Olha um senhor!».

Também eu, há muitos anos, olhava lá para cima e encontrava um velho a olhar para nós, cá em baixo. O Homem da Lua é um velho companheiro da humanidade… A mais conhecida imagem é a do filme de Georges Méliès, Le voyage dans la Lune (1902), em que o tal senhor da lua tem uma nave no olho.

A culpa é da pareidolia, a nossa tendência para ver padrões onde não existem mais do que (neste caso) manchas aleatórias — se olharmos o tempo suficiente para nuvens ou para rochas, também começamos a encontrar objectos e pessoas.

A Lua, que nos acompanha desde sempre, engana-nos de mais maneiras. Quando está perto do horizonte, por exemplo, todos a vemos como se fosse muito maior do que quando está um pouco mais acima.

Se usarmos uma régua ou uma moeda para comparar, vemos que o círculo não aumenta nem diminui — mas todos conhecemos a lua gigante (e muitas vezes laranja) de certas noites… O nosso cérebro tem ali qualquer coisa que interpreta a lua como sendo muito maior do que realmente é.

Por fim, a maior ilusão de todas: a Lua e o Sol parecem ter o mesmo tamanho. Aos humanos que pensavam nestas coisas há uns bons milhares de anos, pareceria perfeitamente natural que o rei dos dias e a rainha das noites tivessem o mesmo tamanho. Tanto assim é que a Lua consegue tapar o Sol perfeitamente durante um eclipse total.

Na verdade, a Lua é 400 vezes mais pequena que o Sol — só que também está 400 vezes mais perto da Terra… O que pareceria algo natural na pré-história parece-nos hoje, que sabemos a real dimensão destes astros, uma extraordinária coincidência.

A origem da palavra «lua»

Não é só o astro ou a forma como o vemos que nos espanta. O nome que lhe damos tem muito que se lhe diga. Em português, por exemplo, a Lua faz-se acompanhar de um capricho ortográfico: escreve-se com maiúscula se se referir ao satélite natural da Terra e com minúscula se se referir à forma como nos aparece à noite — assim, digo «Hoje está lua cheia!», mas afirmo que a Humanidade já chegou à Lua. A palavra também se escreve com minúscula quando se refere a satélites em geral, como «as luas de Júpiter».

Mas e o nome da Lua, de onde veio? A nossa palavra veio do latim, ali direitinha pelos séculos fora. Pelo caminho ficou com uma cicatriz — mas já lá vamos. Antes, escavemos um pouco mais fundo. A palavra latina «luna» terá vindo do proto-indo-europeu, a língua que deu origem a quase todas as línguas da Europa (e arredores), reconstruída pelos linguistas nos últimos 200 anos.

Nessa língua, haveria duas formas de designar a lua: a primeira, mais comum, era «*mḗh₁n̥s», que derivava do verbo com o significado de «medir» —  a lua servia para medir o tempo… A mesma palavra era usada para designar a subdivisão do ano e, com esse significado chegou até nós na forma «mês». Foi a partir do mesmo vocábulo que apareceu também o nome inglês «Moon» — e muitas outras luas por essa Europa fora.

A outra palavra, que tudo indica ser usada em discursos mais poéticos, era «*lówksneh₂», que significava algo como «objecto brilhante» (aliás, a raiz desta palavra também nos deu vocábulos como «luz»). Com o debastar constante das línguas pelos séculos (sempre compensado com materiais que se vão juntando noutros pontos do léxico ou da gramática), esta palavra acabou na «luna» latina.  

A cicatriz da palavra

Pois bem: a «luna» latina continuou a ser dita pelos séculos fora, até hoje, sem grandes alterações. Começando pela «lună» romena e passando pela «luna» italiana, a «lune» francesa, a «lluna» catalã, a «luna» castelhana (há mais umas quantas pelo caminho, eu sei), chegamos à «lua» do galego e do português.

A palavra é a mesma, mas com uma ferida que há muito cicatrizou: falta-lhe a letra N e, na boca dos falantes, o som correspondente.

Os falantes de latim ali para o noroeste da Península, em séculos tão recuados que nem Portugal havia, começaram a deixar cair os sons representados pelas letras N e L quando estes aparecessem entre vogais.

Porquê? Não se sabe. Pode ter sido influência de língua anterior, falada por aquelas bandas, ou talvez uma moda que pegou até se cristalizar no português. O certo é que dizemos «lua» e não «luna». 

Mais tarde, quando importámos palavras do latim ou doutras línguas latinas, trouxemo-las com as letras perdidas — e assim ficámos com «lunar» ao lado de «luar» e de «Lua». A língua é feita assim, da mistura de materiais com origens e percursos que nem imaginamos quando usamos as palavras.

Para lá dos nomes que damos às coisas, há a imaginação, as histórias que contamos, a vontade de lá chegar. Sugiro a leitura do livro A Lua É Um Romance, da astrónoma francesa Fatoumata Kebe (publicado em português há poucos dias, com tradução de André Tavares Marçal). O livro conta os mitos e histórias que fomos tecendo sobre a Lua — e ainda explica tudo o que sabemos sobre a sua origem (do astro, não da palavra).

Ainda nem passadas sete décadas do filme de Méliès, chegámos mesmo à Lua, alunando não num olho, mas no Mar da Tranquilidade. Sobre esse feito, sugiro o surpreendente documentário Apolo 11, de Todd Douglas Miller (2019). Foi composto exclusivamente com imagens de arquivo — e deixa-nos de boca aberta, mesmo sabendo como acaba a história.

A história, na verdade, não acaba. Havemos de lá voltar — e, entretanto, haverá sempre uma criança a olhar para a lua, a imaginar e a fazer perguntas.

sábado, 14 de agosto de 2021

Mi tía Mecha

 


                   Mi tía Mecha

A casi tres meses de la partida de Tía Mecha, Mercedes Toloza de Bustos, el recuerdo, la memoria, y el análisis amoroso de una gran amiga de la tía y de mis primas, Ivana Chacon.

Ivana Chacon
Se fue Mecha, Mercedes Toloza de Bustos, hace instantes, viaja con su luz, su lucha, se lleva consigo su sabiduría, luchando tantos años por su hijo desaparecido, Mecha bis abuela de Almendra, dejó marcas; agradezco mucho haber podido compartir tanto con ella.
Agradezco con mi corazón que se haya abierto a contarme toda su historia, a recibirme en su casa todas las veces que quisiera ir, a pasar días juntas, compartirme su habitación, su cama, su cocina, sus comidas, muestras totales de amor y de lucha, día a día, una entrega de amor hacia nosotras...ella sabia de las cosas difíciles, de continuar a pensar de todo, sabia y aprendió a ser feliz y a transmitir todo su amor a la vida.
Almendra seguirá su lucha, vivirá sosteniendo que hay que ser mas humanos, sabiendo que nunca más tenemos que vivir el horror, que tenemos que tener un mundo democrático, ser consciente de hacer el bien, de amor, de vivir con amor y así este mundo va a ser mas agradable, espero estas generaciones puedan cambiar la historia.
Aquí dejo un fragmento de lo que escribí sobre mecha, un proyecto que lo hice con mucho amor y respeto, viaja lindo Mecha!!!!

El dispositivo realizado junto a Mecha, registrándola con un video performance, cocinando una receta de su mamá, en memoria de su hijo Jorge Dante Bustos, como mamá, como educadora en escuelas. En su casa, en un espacio tan íntimo como la cocina, representando ese recuerdo de cuando le cocinaba sus postres preferidos a Jorge. Es en esa instancia donde vemos su forma de no olvidar y seguir en sus memoria esos instantes de amor hacia su hijo, desde un lugar íntimo, que aun sigue teniendo sus fuerzas para seguir construyendo desde el amor hacia su familia y bisnietos cocinándoles, contándoles, dejando su legado y de esta manera su historia.
Me gustaría compartir aquí una de las anécdotas: reunió a sus bisnietos en su casa, para contarles lo sucedido con su tío abuelo Jorge Dante Bustos, les preparó cosas dulces y un té, en donde se encontraba el retrato de Jorge a modo de tenerlo presente en imagen y les relató lo que le había pasado. Algunos oían con atención, otros se tapaba los oídos, otro pedía permiso para retirarse comunicándole que no podía sostener esa historia.
Este encuentro fue un modo de dejar un legado y trabajar el recuerdo para una memoria y no el olvido, tratando de concientizar la lucha heredada, que no tan solo heredan sus recetas de cocina sino que también heredan una lucha que viene sosteniendo hace ya cuarenta años. Podría citar también del libro La memoria, la historia, el olvido del filósofo Paul Ricouer a Bergson que, establece entre recuerdo-puro y recuerdo-imagen, pasando a detallar el paso de estos dos, describe que el recuerdo-puro aún no está configurado en imágenes y que para poder obtener el recuerdo en imagen, hay que abstraerse del presente, e ir a buscarla al pasado, siguiendo así el proceso continuo que la llevó de la oscuridad a la luz. Siguiendo esto el recuerdo –puro conduce al recuerdo- imagen.
Lo importante es exigir la verdad que esté implicada en el objeto de la cosa pasada, de lo anteriormente visto, oído, experimentado, aprendido. Es en el momento del reconocimiento, con el que concluye el esfuerzo de la rememoración, cuando se declara esta exigencia de verdad. Entonces sentimos y sabemos que algo existió, que algo tuvo lugar que nos implicó como testigos. Llamemos fidelidad a esta exigencia de verdad. Esto ayuda a la ejercitación de la memoria.
Cuando cuento sobre la historia de Mecha en su lucha desde lo más íntimo, eso nos conduce de las condiciones formales al contenido de las cosas pasadas, de las condiciones de posibilidad al proceso efectivo de esta historia. Aquí se abre un proceso que conozco y que parte de la memoria, pasando por este escrito y dispositivo video performance como prueba de lo vivido. Resurgiendo al final del recorrido de este reconocimiento vivido al plano de la representación del pasado por el relato y la configuración en imágenes.
Con este dispositivo más este escrito, quiero formar mi propio archivo, es un lugar físico que aloja el destino de estas huellas, cerebral, afectivo, es decir, la huella documental. En la que se enmarca no tan solo lo personal sino que también lo social.
Por tanto también aquí estamos hablando de una huella interna y externa que estructura la prueba documental, por una prueba de indicios, la huella habla y nos cuenta.
En el capítulo sobre El Olvido, Ricouer, dice que el olvido es percibido primero y masivamente como un atentado contra la fiabilidad de la memoria.
La fiabilidad del recuerdo está suspendida en el enigma constitutivo de toda la problemática de la memoria, a saber, la dialéctica de presencia y de ausencia del corazón de la representación del pasado, a lo que se añade el sentimiento de distancia temporal de la imagen, sirva esta para describir o para fingir. La problemática del olvido, formulada en su nivel de máxima profundidad, interviene en el punto más crítico de esta problemática de presencia, de ausencia y de distancia, en el polo opuesto a este pequeño milagro de memoria feliz, constituida por el reconocimiento, actual del recuerdo pasado.
El olvido, por tanto el recuerdo, equivale al olvido, por que no se trata del olvido que la materialidad pone en nosotros, el olvido por supresión y borrado de las huellas, sino el olvido que podemos llamar de reserva o de recurso.
Por tanto el olvido designa el carácter desapercibido de la perseverancia del recuerdo, su sustracción a la vigilancia de la conciencia.
Mecha no olvida ninguna instancia, no olvida ni un solo día su lucha, su recuerdo está presente, su legado es lo que le interesa, para que su familia siga su lucha cuando ya no esté más.
La intención es que esta historia no se repita, y que todo se construya desde el amor.
Ricouer nos describe la memoria: “la fidelidad al pasado no es un dato sino un deseo”.
Sus recuerdos vuelven a dar imágenes cotidianas de momentos de lucha, dentro y fuera de la casa.
Por
Ivana Chacon