Semelhanças e diferenças entre o trabalhismo de Getúlio Vargas no Brasil e o peronismo de Juan Perón na Argentina.
Getúlio Vargas chegou ao poder por meio de um levantamento militar em 1930 e ficou na presidência do Brasil até 1945. Durante este período Vargas não passou pelo teste das eleições. Ainda assim, aprovou uma nova Constituição em 1934, incentivou um rápido processo de industrialização e desenvolvimento, regulamentou sindicatos, combateu com dureza os movimentos oposicionistas, estimulou a exploração do sertão e promoveu transformações importantes no Estado para que tivesse maior participação nos rumos da sociedade.
Juan Domingo Perón, que também foi militar e participou de um golpe dentro do período mais conservador da democracia argentina, chegou ao poder por meio de eleições, - como candidato aclamado e liberado pelo povo depois de ser preso- e ficou na presidência entre 1946 e 1955, sendo reeleito em 1951 para seu segundo mandato, que não terminou, derrocado pelo golpe de 1955.
Seu governo foi marcado pela regulamentação dos sindicatos, uma forte aproximação das classes trabalhadoras, a luta contra as oligarquias entreguistas aliadas aos monopólios internacionais, a estatização de ferrovias, empresas de telefonia, petróleo, companhias de eletricidade, e por uma grande melhoria na renda da população. A justiça social, com a marca do "Justicialismo", foi à prioridade do governo de Perón.
E sobretudo, ao lado do Perón militar, havia uma Eva Perón, a mítica Evita, como radicalizadora de todo o processo.
Ambos dirigentes, Vargas e Perón, foram depostos por juntas militares e voltaram mais tarde ao poder nos braços do povo, eleitos pelo voto direto, e ainda morreram - cada um ao seu modo- ocupando os cargos de presidentes. Vargas esteve à frente da presidência entre 1951 e 1954 quando cometeu suicídio no Catete e Juan Perón voltou a presidir a Argentina em 1973, depois de 18 anos de proscrição e exílio, mas governou apenas 9 meses devido ao seu falecimento em julho de 1974.
Getúlio Vargas se manteve no centro da cena política no período entre as duas grandes guerras mundiais quando o nazi-fascismo protagonizava o auge da sua alternativa como ideologia forte, em meio à tempestade econômica mundial das décadas de 1920 e 1930, colocando o foco das críticas nas teorias do liberalismo, ao tempo que se mostrava um feroz inimigo do comunismo e das esquerdas em geral. Neste contexto, o papel do estado tomava relevância e exigia transformações institucionais significativas.
Já a era de ouro do peronismo argentino surgiu após a 2ª Guerra Mundial, de encontro ao novo conflito ideológico - e político-social- internacional que entrava em cena, a Guerra Fria.
O governo "Justicialista" não se posicionou entre os Estados Unidos e nem a União Soviética mantendo sempre uma certa neutralidade; o seu slogan era "nem ianques nem marxistas, peronistas”. Por outro lado, diferente de Getúlio Vargas que a partir do Estado Novo, em 1937, criou um governo ditatorial, Perón não transformou sua presidência num regime de ditadura institucionalizada. O que não o impediu de perseguir opositores de seu governo.
Juan Domingo Perón também jogava nas oligarquias ligadas ao grande capital internacional a culpa pela grande desigualdade social na Argentina daquela época, o desamparo aos trabalhadores e a presença estrangeira, principalmente da Grão Bretanha, que explorava os serviços essenciais do país - ferrovias, redes de energia e exploração do petróleo.
A partir de 1943 quando Juán Perón participa ativamente do Grupo de Oficiais Unidos (GOU) que derruba o governo de Ramón Castilho encerrando a chamada "Década Infame", iniciada em 1930 com o golpe de estado de Uriburu, década marcada por fraudes eleitorais, repressão aos opositores e corrupção generalizada. Sendo assim, a propagação das ideias nacionalistas, desenvolvimentistas e populares do peronismo nascente enfatizavam a importância das ações e mudanças significativas.
E tanto no caso de Getúlio Vargas se justificava a importância da estruturação do estado brasileiro como grande prioridade, como no caso de Perón ao priorizar a justiça social ou justicialismo. Esta é uma das diferenças entre o varguismo e o peronismo, as diferenças nas suas prioridades.
Os dois partidos do trabalhismo e o justicialismo.
O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) foi o partido fundado por Getúlio Vargas, a quem deu sustento político, e que existiu durante dois períodos: nos anos democráticos de 1945 a 1965, tendo sido recriado em 1985, após a abertura do regime militar de 1964.
Também deu apoio ao programa varguista o PSD, que defendia a legislação trabalhista e a intervenção do estado na economia. A primeira comissão diretora do partido, inclusive, foi composta por Getúlio Vargas como presidente, Benedito Valadares, como 1º vice-presidente, e Fernando Costa como 2º vice-presidente. Na prática, porém, Vargas nunca assumiu suas funções, que a princípio ficaram a cargo de Benedito Valadares em caráter interino.
Tanto o PTB - mais tarde escindido pelos seguidores de Brizola que fundou o PDT- como o PDS não conseguiram sobreviver em popularidade ao seu primeiro líder, o próprio Vargas, ou aos seus seguidores, Jango Goulart e Brizola.
O peronismo, pelo contrário, acompanhou não só os 10 anos dourados dos primeiros governos do seu líder, como se fortaleceu nos 18 anos do exílio, passou pelas crises da morte e sucessão de Perón pela esposa e companheira de fórmula, Isabelita, e sobreviveu a novos sete anos de ditadura genocida (1976-83).
O peronismo - diferente do seu partido, o Justicialista- nunca deixou de ser um amplíssimo movimento, que abrigou tanto aos herdeiros da Resistência Peronista dos anos do exílio e proscrição, - a Juventude Peronista e as guerrilhas dos Montoneros-, como a bandas fascistas - as Três A do "Brujo" López Rega- antes do golpe de 1976, e depois dele ao neo-liberalismo feroz do presidente Menem, e logo depois viu o retorno a uma proposta desenvolvimentista, nacionalista e popular mais esquerdista e apoiada nos movimentos sociais e pelas correntes mais combativas, com o casal Nestor e Cristina Kirchner, na década de 2003 a 2015.
JV. São Paulo, abril de 2015
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