Vargas Llosa conta em seu "El Sueño del Celta" as aventuras de Roger Casement, pesquisador do governo britânico dos excessos da indústria da borracha no Peru e no Brasil.
Isso me levou, em maio passado, a mostrar um pouco mais da história de Fitzcarrald ou Fitzcarraldo, o mesmo que Werner Herzog levou às telas do cinema em 1982.
Veja “El Caucho y Fitzcarrald” e “Uma outra Aventura Amazónica” em:
Leia também: http://www.imdb.com/video/screenplay/vi2678522137/
Agora a Folha de S. Paulo vai lançar a coleção de vídeos que traz o filme de Werner Herzog. Por isso achei oportuno contar o que os jornais da nossa Amazônia brasileira (e é sempre bom lembrar que a floresta amazônica é do Brasil, Peru, Venezuela e Colômbia, e de ninguém mais ao norte do Rio Bravo) andam publicando sobre Casement e a borracha (el caucho) naquela época infausta do ciclo extrativista que arrasou tribos inteiras, e deixou um rasto de desolação e misérias.
Fitzcarrald, o filme, foi um dos mais difíceis de produzir: uma tonelada de navio passando sobre uma montanha sem efeitos especiais, e as cenas feitas a bordo do navio chocando as correntezas, ferindo metade da equipe de filmagem. Herzog, com o filme, ganhou como Melhor Diretor no Festival de Cannes. O documentário Burden of Dreams de Les Blank é sobre o "making of" do filme.
Mas Fitzcarrald, o homem de carne e osso, foi uma experiência ainda mais dura: em junho de 1894, no porto de Iquitos, no Peru, centenas de pessoas dão um "adeus delirante" ao Contamana , que sai navegar os rios da selva desconhecida para achar um istmo nas montanhas e chegar em Manaus, Brasil.
Fitzcarrald discursou para o povo de Loreto: "Reunimo-nos homens da Europa, Ásia e América sob a bandeira peruana, não empreender mais uma aventura, mas para oferecer a humanidade esta terra generosa, onde se pode encontrar um novo lar para os necessitados no mundo. Cidadãos do centro, norte e sul do Peru, vão acompanhar-me na maior aventura que tem acontecido nas montanhas de nosso país nos últimos tempos . Eu garanto que o sucesso coroará nossos esforços adicionará novas glórias para nossa bandeira. Povos prados e tribos Cocamas, capanaguas, mayorumas, remos, Cashibos, Piro e Witotos: como um bom pai e um vingador vou dar-lhes a recompensa da montanha divina, que se estende desde o sol nascente, onde a caça abundante espera por vocês, darei a pólvora e balas para suas armas para derrubar os animais. Para obter a vitória que precisamos rapido e com segurança, sem uma pausa". Fitzcarrald, não o do filme de Herzog, o da história, era um herói, um patriota, quase um deus para seu povo.
O seringueiro lendário, porém, é contestado por seus efeitos sobre os nativos da floresta. Sem tantos escândalos como o de outros aventureiros, a saga de Fitzcarrald na sua busca de riqueza, mesmo com o seu patriotismo e ideais da civilização, sacrificou centenas de vidas. Numa época em que a ação do Estado era insignificante, a única lei era o rifle. Fitzcarrald foi um líder violento e paternalista. Ainda assim, como tantos aventureiros que exploraram a riqueza e o povo da América, Carlos Fermín Fitzcarrald é lembrado como um empresário.
Mas, deixando outra vez o Fitzcarraldo para voltar a Roger Casement, há notícias na imprensa inglesa que contam que uma índia amazônica lançou um apelo para descobrir o destino de dois índios escravos trazidos para a Grã-Bretanha há cem anos atrás.
Um século após o jornal “Daily News” ter apresentado seus antepassados Omarino e Ricudo pela primeira vez ao público britânico, Fany Kuiru, índia Witoto da Colômbia, fez um apelo para “ajudar a descobrir o destino de nossos irmãos indígenas, para que os espíritos de nossos antepassados possam descansar em paz.”
Os índios foram “presenteados” ao Cônsul Britânico Roger Casement em sua terra natal, Putumayo, ao sul da Colômbia em 1910. Omarino tinha sido trocado por um par de calças e uma camisa; Ricudo, num jogo de cartas. Casement, enviado pelos britânicos para investigar as atrocidades na Amazônia peruana e brasileira durante o ciclo da borracha, levou os dois para Londres para divulgar os horrores que tinha descoberto.
É que a enorme demanda pela borracha amazônica começou quando a americana Goodyear descobriu o processo de vulcanização, que endurece a borracha o bastante para poder ser usada na fabricação dos pneus. A descoberta gerou a primeira produção em massa de carros pela Ford.
Em apenas 12 anos, estimava Casement, 30 mil índios foram escravizados, torturados ou mortos para suprir a alta demanda de borracha para a Europa e os Estados Unidos: “Nós levam muito longe na floresta para pegar borracha, e se nós não conseguimos, ou não fazemos rápido o suficiente, levamos tiro”, contou Omarino -um dos índios colombianos levados por Casement a Londres- ao Daily News naquela época. Muitas das tribos de índios isolados, descendentes dos sobreviventes do ciclo da borracha, fugiram nas nascentes do rio para escapar dos crimes, torturas e epidemias que dizimaram a população indígena.
Depois de ver as fotos de seus antepassados, Fany disse que “cada nação fez sua parte para exterminar os povos indígenas: Colômbia os negligenciou, Peru foi mentor e cúmplice do holocausto, Inglaterra o financiou, e o Brasil tirou os índios de suas raízes para trabalhar nas plantações de borracha.”
Não sabemos que fim levaram os dois escravos, cuja despedida no Daily News foi: “Londres é linda, mas o grande rio e a floresta, onde os pássaros voam, é muito mais bonito. Um dia vamos voltar.” Nunca saberemos se conseguiram voltar para casa.
Stephen Corry, diretor da Survival International, disse que “o ciclo da borracha parece uma história remota, mas seu efeito ainda está conosco. Quando Ocidente casou com o automóvel, as cartas de amor foram escritas com sangue dos índios. Foi um crime grave contra a humanidade, o de uma empresa britânica, na área dos Witoto. Não devemos exager, mas hoje ainda há empresas britânicas, como a Vedanta Resources, planejando o roubo de terras tribais, na Índia. É hora de pôr um fim a estes crimes e começar a tratar os indígenas como seres humanos.”
E voltando de novo a Roger Casement, hoje é claro para quem não o sabia, depois de ler “El Sueño Del Celta” de Vargas Llosa- era um idealista. Pensava que o comércio, a religião e as instituições europeias tirariam a África da selvageria em que vivia. Em 1884, com 20 anos, saiu em uma expedição paga pelo rei Leopoldo II da Bélgica, "dono" do Congo. A ideia era preparar o país –que um ano mais tarde seria o Estado Livre do Congo, uma concessão da coroa belga– para o comercio dos exploradores europeus. Em pouco tempo Casement viu que a ação dos europeus na África não era nada civilizatória.
Mais tarde, cônsul da coroa britânica, voltaria ao Congo para documentar a barbárie dos colonizadores contra os nativos. Seu trabalho ganhou fama e o levou até o outro cenário deplorável: a Amazônia peruana, onde uma grande empresa produtora de borracha explorava os índios escravizados. Casement denunciou o extermínio dos índios naquela região. Foi reconhecido internacionalmente como humanista e condecorado pela coroa inglesa. Mas seu trabalho também o levou a questionar a subjugação da sua Irlanda natal pelo império britânico, e dai para o cárcere e a morte na forca.
Leia mais sobre Fitzcarrald em:
http://javiervillanuevaliteratura.blogspot.com/2011/04/otra-aventura-amazonica.html
Veja mais sobre Roger Casement em:
http://javiervillanuevaliteratura.blogspot.com/2011/05/los-inframundos-de-roger-casement.html
Leia sobre o filme "Fitzcarrald" de Herzog; visite o site:
http://www.wix.com/crianc2/javier-villanueva-literatura
Hay más sobre la filmación de la película de Herzog, "Fitzcarraldo", que cuenta las aventuras en la selva peruana en el sitio-web de Javier:
ResponderExcluirhttp://www.wix.com/crianc2/javier-villanueva-literatura