sexta-feira, 8 de maio de 2020

Alfredo e as janelas indiscretas do Bexiga.

Bairro do Bixiga (SP) – 30 de passagem


Alfredo e as janelas indiscretas do Bexiga.

Dois anos atrás, depois de uma longa jornada batendo perna na 44ª Feria Internacional del Libro em Buenos Aires, já de saída, com quem me encontro inesperadamente numa esquina? Sim, com o Alfredo Barrionuevo, que estava relançando uma das suas obras. 
Mas não é estranho encontrá-lo assim, de supetão, depois de já té-lo visto caminhando pela Marginal do Tietê, perto do Brás, quando ainda morava em São Paulo, ou meus filhos trombar com ele nas mais diversas linhas do metrô.
Mas a melhor foi um dia em que comíamos calmamente uma pizza na famosa esquina do Bexiga, -a mais antiga, cujo nome não lembro agora- com Cristina Pacheco, e depois de três ou quatro cenas bem ao estilo "Uma Janela Indiscreta", ou "Mujeres al borde de una ataque de nervios", vimos aparecer o Alfredo, assim, do nada.
Para entender melhor o relato, imaginem que estávamos jantando, bem tarde à noitão, grudados numa janela de vidros fechados, que impediam ouvir nada do que se passava na rua. Mas nós podíamos ver tudo para fora, sim, e assim foi que vimos primeiro um casal chegando num carro, namorando cada vez mais ardentemente, beijos, pernas e mãos, até que de repente estoura uma briga: ela bate, ele bate, três ou quatro tapas cada um, numa rápida sequência, até que a moça sai do carro e ele, desesperado mexe a boca -e nós nada de ouvir nada- e, numa tentativa de abre e fecha porta, termina prendendo a mão da moça que grita -muda para os nossos ouvidos surdos- e esperneia até que ele abre a porta e voltam a se beijar apaixonadamente. 
Bom, esquecemos, chegou a pizza e, assim que vai o primeiro garfo na boca, novo tumulto, e vemos passar, a escasso metro dos nossos narizes -a essa altura nós dois já grudados no vidro, esquecidos da pizza, suando e desesperados- um homem perseguindo um outro com uma peixeira de meio metro. Nós angustiados dentro da pizzaria, fazendo caras e caretas de horror, e os outros comensais sem entender bulhufas. 
Acalmada a última cena almodovariana, a menos de um par de minutos, quem passa calmamente ao lado da janela, sempre do lado da calçada? O Alfredo Barrionuevo, é claro.
Risadas e batidas nervosas no vidro, até que saio correndo a chamá-lo e claro, tudo termina em pizza, como corresponde.

Fin.
Javier Villanueva. San Fernando del Valle de Catamarca. Agosto de 2022.


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