terça-feira, 12 de maio de 2020

Antonio Candido. Um alento humanista.


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Também tive, como Elizabeth, minha amiga e autora do texto, a sorte de conhecer Antonio Candido quando a Librería Española e Hispanoamericana trouxe o FCE -Fondo de Cultura Económica do México- em 1991. E o grande professor e escritor foi convidado para a inauguração da editora em São Paulo. JV.

Um alento humanista

Antonio Candido se foi há 3 anos. Tive a sorte de conviver um pouco com o grande professor, que, como eu, morou em Poços de Caldas e amava. 
Seu pai médico foi diretor da Termas. Me contava historias dos antigos habitantes, que infelizmente não gravei. No seu precioso livrinho, "Teresina e etc.", escreve sobre a socialista italiana, vizinha de sua mae. Muito lindo. Disse que ela lhe indicava livros em italiano e ajudou na sua formação.
E eu nem sabia que em Poços tinha havido anarquistas, ele contou.
Mas claro, porque foi grande a imigração italiana, inclusive dos meus. Disse que o sapateiro de sobrenome Caponi sabia de cor os cantos da Divina Comedia. E recitava a quem pedisse.

Eu o conheci quando escrevi a dissertação de mestrado que se tornaria livro sobre o Suplemento Literario do Estadão, que ele fundou em 1956, junto com Decio de Almeida Prado, a quem ele chamava de "ser de exceção".
Dois seres de exceção esses. Que falta eles fazem. E num quadrinho pendurei trecho do discurso do professor, quando ganhou o Juca Pato, em 2008. Para os nossos dias, um alento humanista:

"Devo ser de fato tão antiquado, que venho sendo definido em algumas instâncias como "ilustrado", devidamente entre aspas, e como alguém preso a uma visão de tipo teleológico da história e do pensamento. Devo esclarecer que, ao contrário do que se poderia pensar, considero esta restrição um elogio. Ela quer dizer que me mantenho fiel à tradição do humanismo ocidental definida a partir do século XVIII, segundo a qual o homem é um ser capaz de aperfeiçoamento, e que a sociedade pode e deve definir metas para melhorar as condições sociais e econômicas, tendo como horizonte a conquista do máximo possível de igualdade social e econômica e de harmonia nas relações. O tempo presente parece duvidar e mesmo negar essa possibilidade, e há em geral pouca fé nas utopias. Mas o que importa não é que os alvos ideais sejam ou não atingíveis concretamente na sua sonhada integridade. O essencial é que nos disponhamos a agir como se pudéssemos alcançá-los, porque isso pode impedir ou ao menos atenuar o afloramento do que há de pior em nós e em nossa sociedade. E é o que favorece a introdução, mesmo parcial, mesmo insatisfatória, de medidas humanizadoras em meio a recuos e malogros. Do contrário, poderíamos cair nas concepções negativistas, segundo as quais a existência é uma agitação aleatória em meio a trevas sem alvorada.
É com este espírito talvez obsoleto de velho intelectual participante, como se dizia naquele tempo, que aqui estou para agradecer de coração esta desvanecedora homenagem."


Candido e sua mulher Gilda de Mello e Souza, outra grande intelectual
Foto Bob Wolfenson.

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