O que foi a “Zwi Migdal”?

—A evocação da "Zwi Migdal" é a triste lembrança de uma dura realidade que se havia estabelecido em todos os portos da América, de Nova York a Havana, passando por Rio de Janeiro, Santos, Porto Alegre e Buenos Aires: a da máfia dos maiores traficantes de mulheres na história do continente— toma a revista Primera Plana em suas mãos, a folheia com um certo tédio, e lê para mim um trecho, pára e boceja a pleno pulmão minha prima Muñeca.

—Com a doçura da palavra mágica -América- ainda soando como música aos ouvidos, o polonês Trauma Noah chegou a Buenos Aires em 1906; tinha documentos falsos como tantos outros dos muitos refugiados que fugiam da polícia política do czar Nicolau II— ainda continua lendo, mesmo sem muito interesse, Muñeca.
—Na sua Polónia natal deixava um passado de anarquista que o tinha levado, como a muitos outros jovens do seu tempo para a ação direta— lê minha prima.
—Trauma foi um dos três milhões de imigrantes europeus que chegaram na Argentina nas primeiras décadas do século XX— diz Carlitos Fresia e se mexe um pouco para deixar passar o alegre grupo de estagiários da medicina que está chegando para fazer as visitas médico-hospitalares na clínica do Passeio Sobremonte.
—O novo século viu o deslumbramento de uma elite rica e sofisticada, vestindo as modas e imitando cada um dos usos e costumes das escolas europeias em Buenos Aires, uma cidade cosmopolita, onde a prostituição só era criticada pelos moralistas— continua lendo Fuenzalida e meu tio Luis sorri, meio relutante.
—Trauma Noé, que conhecia o sucesso dos franceses, os catalães e vários patrícios na sua comunidade judaica que se dedicavam à exploração de mulheres no Brasil, reuniu um grupo de judeus poloneses e fundou a Sociedade Israelita de Auxílio Mútuo "Varsóvia"— diz Fuenzalida, e puxa as cortinas do quarto do hospital, deixando entrar uma luz forte da manhã, vinda por entre as árvores do Passeio Sobremonte.
—Ele conseguiu legalidade jurídica, escondendo muito espertamente das autoridades o seu real objetivo: criar um clube que "importaria jovens polonesas" para depois levá-las a leilão como prostitutas— diz Juancito e passa a chaleira e a erva-mate a Fuenzalida. E eu sinto que minha febre está de volta e acho que mais uma vez, os que estão em volta da minha cama, repetem tudo o que já tinha sido dito antes.
Clip de "De utopias e do amores, De demônios e heróis da pátria ", Javier Villanueva


¿Qué fue la “Zwi Migdal”?

“––La evocación de la “Zwi Migdal” es la remembranza triste de la dura realidad que se había emplazado en todos los puertos de América, desde Nueva York, pasando por La Habana, Río de Janeiro, Santos en São Paulo, Porto Alegre y Buenos Aires: la mafia de tratantes de blancas más grande de toda la historia del continente–– toma la revista “Primera Plana” en sus manos, la hojea con aburrimiento, me lee un trecho y bosteza, mi prima Muñeca.

––Con el dulzor de la palabra América repiqueteándole en los oídos, como la música seductora de tantos emigrantes europeos, o quizá como su última peripecia de sobrevivencia, el aventurero Noé Trauman llegó a Buenos Aires en 1906; llevaba papeles falsos como uno más de tantos prófugos de la policía política del zar Nicolás II–– sigue la lectura, sin demasiado interés, Muñeca. ––En su Polonia natal dejaba un pasado de anarquista que lo había llevado, como a muchos otros jóvenes de su época, a la acción directa–– lee mi prima.
––Trauman era uno entre tres millones de inmigrantes europeos que aportaron a Argentina en las primeras décadas del siglo XX–– dice Carlitos Fressie y se aparta un poco para que pase el alegre grupo de practicantes del Clínicas que está llegando de visita médica al sanatorio Sobremonte.
––El nuevo siglo vio el ofuscamiento de una elite riquísima y sofisticada que llevaba todas las modas y cada una de las usanzas de los centros europeos a Buenos Aires, una hermosa ciudad cosmopolita donde a la prostitución sólo la criticaban los moralistas–– lee Fuenzalida y mi tío Luis sonríe, medio sin ganas.
––Noé Trauman, que conocía el éxito de los franceses, los catalanes y de varios paisanos de su comunidad dedicados a la explotación de mujeres en Brasil, juntó un grupo de judíos polacos y fundó la Sociedad Israelita de Socorros Mutuos “Varsovia”–– comenta Fuenzalida, y corre las cortinas del cuarto del sanatorio, dejando entrar una fuerte luz matinal desde el Paseo Sobremonte. ––Logró personería jurídica, ocultando ladinamente a las autoridades su real objetivo: crear un club que “importaría jóvenes polacas” para subastarlas como prostitutas–– agrega Juancito y le pasa la pava y la yerba a Fuenzalida. Y yo siento que me vuelve la fiebre y me parece que repiten de nuevo todo lo que ya habían estado contando antes.


Trecho de "De utopías y amores, de demonios y héroes de la patria", Javier Villanueva