terça-feira, 24 de maio de 2011

O avô Victoriano e Garibaldi



San Pablo, Brasil, 3 de setembro de 1979. “Victoriano lembra que no nascimento do século XX, milhares de imigrantes seguiam chegando à Argentina: ––Mais de 125 mil italianos chegaram no mesmo ano da inauguração do monumento a Garibaldi. Também começaram a construir por aquele tempo o terminal de trens do Retiro, um verdadeiro modelo da arquitetura moderna–– diz o velho.”

Córdoba, 23 de abril de 2006, cinco da tarde.
Olho o cartão postal que o avô Victoriano lhe mandou a Eufemia; igual que o recorte da revista Billiken, está colado com goma arábiga, do tipo amarelado ámbar, que o meu velho usava no escritório da empresa em que trabalhava, a Águila-Saint; chama a atenção, olhando os detalhes do cartão, a rede tranviária que entrecruza as guias e forma uma graciosa teia de aranha entre os paralelepípedos de granito da Praça do monumento a Garibaldi. Em primeiro plano dá para ver um carro da Companhia de Bondes Elétricos de Buenos Aires e Belgrano. No fundo, da praça, emoldurada por grandes portões de ferro forjado que na época cercavam a futura Praça Itália, passa um tramway. Volto ao manuscrito:

" ––Você vê o bonde carregando um reboque que transporta trabalhadores de uma empresa?. Consegue ver a estátua? Garibaldi foi um italiano famoso, nascido na França, numa cidade disputada pelos franceses–– Victoriano me diz. ––Grande parte da sua vida aventureira ele passou entre o Brasil, Uruguai e Argentina. O herói da soberania e da unificação da Itália era reverenciado não só pelos seus conterrâneos, mas também pelos habitantes do Rio da Prata e do Brasil–– dobra o jornal La Unión, guarda no bolso do casaco de flanela, tira os óculos e limpa os cristais lentamente. ––Sim, mas mais tarde foi muito criticado pelos historiadores revisionistas que pintaram suas ações como as de um personagem controverso, e por vezes mesmo como se se tratasse de um mercenário, ou incluso até de um pirata–– penso com os meus botões, sem me atrever a comentar nada, porque o velho é meio cego na sua admiração pelo Italiano.

––Alguns dizem que foi um corsário, oportunista e inescrupuloso–– Ouço surpreso o comentário de Victoriano, lançado entre mate e mate, um pouco ironicamente, e me sobressalto pensando se o velho não estaria lendo meus pensamentos. Acende o cigarro de palha, e eu vejo por debaixo do chapeu de aba inclinada os olhos maliciosos, azuis, do velho que volta ao tema acrescentando: ––Bem, o fato é que, embora já para o final do século XIX era indiscutível que Garibaldi virara um herói, ele voltou com a sua esposa brasileira Anita para a Itália, cheio de nostalgia e de vontade de lucha para libertar e unir sua pátria. Sua vida era o seu lema: "Toda injustiça me move a ação"–– disse meu avô com sua voz de trovão, ecoando as palavras do italiano, e se levanta do banco de couro trançado para oferecer o lugar a Eufemia que chega devagarinho e nos cumprimenta com um sorriso lindo, inesquecível".

Leia mais em "De Utopías e Amores, de Heróis e Demonios da Pátria" J.V. 2006

Um comentário:

  1. Es verdad lo que describe Victoriano: en las fábricas europeas y norteamericanas de finales del siglo XIX se juntaban más obreros que en las multitudes bíblicas de la esclavitud, las campañas militares o marinas, exigiendo una organización espectacular del trabajador.
    Por una parte, el obrero industrial participa en un proceso que se le escapa, cada vez menos comprensible, sin tiempo a adaptarse a los nuevos inventos y su aplicación industrial y bélica; y por otro lado, todo ésto le genera inseguridad: la organización de las fábricas y la producción, o los grandes barrios operarios, que mantienen al trabajador urbano en el límite de la miseria y con el filo de una espada en la cabeza: perder el trabajo en la fábrica podía significar perder el lugar en la ciudad, volver a la miseria de los campos,a deambular como mendigo por las calles atestadas de desocupados.
    O a optar por la emigración.

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